Nesta comédia, França Júnior apresenta o antagonismo entre duas personagens, Teodoro Paixão, pai de Henriqueta Paixão, e Henrique, pretendente à mão de Henriqueta Paixão. É Teodoro Paixão fervoroso adorador de estrangeirismos. Compara o povo do Brasil, e sua cultura, sua língua, seus hábitos, seus costumes, com o povo da Alemanha, da França, da Inglaterra, da Itália, e a cultura, língua, hábitos e costumes deles e entende o povo do Brasil e tudo o que brota em terras brasileiras inferior aos seus similares estrangeiros. Para ele, o povo brasileiro é fútil, bárbaro, leviano, indolente, imerecedor de crédito, e seus valores desprezíveis, irrelevantes. E Henrique se lhe opõem, veemente, em defesa do Brasil e dos brasileiros. Henrique detecta, em seu antagonista e nos tipos que se lhe equivalem, um mal, de ontem e de hoje, que muito prejuízo dá ao Brasil: a ignorância que têm os brasileiros de seus heróis, seus literatos talentosos, seus compatriotas geniais, que construíram, no transcurso de suas vidas, obras meritórias, de valor imperecível. Tal crítica de Henrique aos brasileiros não perdeu, no decorrer de mais de um século após a publicação desta peça, o seu valor; os brasileiros ainda hoje valorizam muito produto estrangeiro desprovido de valor e desvaloriza os equivalentes nacionais que lhes são superiores e dá mais valor a artistas, escritores, músicos estrangeiros medíocres e desdenham os concorrentes brasileiros melhores e mais talentosos e criadores de obras superiores.
Não querendo flertar com patriotadas, há de reconhecer todo brasileiro sensato, que preserva o senso de justiça, capaz de dar a cada obra o seu valor justo, que o brasileiro produz, na literatura, na música, na ciência, obras de valor superior às de muitos estrangeiros que enaltecem, idolatram.
Abandonemos as lamúrias, e tratemos da peça de França Júnior. Desenrola-se a peça, num ato, em treze cenas. Além do desencontro das opiniões de Teodoro Paixão e Henrique acerca do tipo brasileiro, há outro ponto que promove atrito entre as duas personagens: devido ao seu desprezo mortal pelos brasileiros e seu amor irracional pelos estrangeiros, Teodoro Paixão quer que sua filha se case com Mr. John Reed, bretão, engenheiro, que pretende se lançar numa aventura empresarial. Henrique, no entanto, não desiste de seu propósito: o de se casar com Henriqueta Paixão. E para alcançar tal fim, idealiza um projeto - simultaneamente produto da perspicácia e da insensatez de um homem apaixonado -, que, pensa, irá obrigar seu rival a se exibir com sua verdadeira face aos olhos da mulher amada e do pai dela. E o projeto concebido por Henrique, projeto que segue uma direção que ele não previu, o acaso a providenciar-lhe o bom sucesso da empreitada, propicia uma cena hilária.
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