Dois homens
que se lisonjeiam quando convêm, e ofendem-se, e aviltam-se quando lhes é do
interesse. Dois parasitas, vaidosos, que se enganam frequentemente, e
dissimulam-se; fingem que se enganam e que são enganados, e que não se enganam
e não são enganados. Participam de um jogo de gato e rato. E quem é o gato? E
quem é o rato? O político promete; o eleitor acredita que ele cumprirá as
promessas. Acredita? Ou quer acreditar? Ou não acredita? E não quer acreditar?
O político é esperto e ladino, e o eleitor, tolo, ingênuo e inocente? Quem
engana quem, nessa relação promíscua de indivíduos desleais e infiéis? O
político premedita as suas ações, e não realiza as promessas de campanha, as
quais apresenta com tanto vigor e com tanta veemência que acredita, piamente,
que as cumprirá; e o eleitor, toleirão, acredita, aparentemente, ou não, na
sinceridade, inexistente, do político, nele confia (confia?), e espera pelo
cumprimento das promessas, pois, diz o ditado, promessa é dívida. E o político
tem o hábito de pagar as dívidas? O eleitor, cujo ego o político tarimbado sabe
afagar com palavras lisonjeadoras, sorrisos cativantes, deixando-se conduzir
pelo torvelinho da vaidade, incorre em erros crassos, e arrepende-se,
tardiamente, invariavelmente após os estragos decorrentes da ação do político,
causador, este, de problemas, os quais ele promete resolver, e para tanto se
faz imprescindível a confiança, nele, do eleitor. O político é a raposa que o eleitor
elege para zelar pela granja. E o eleitor recolhe os despojos, e proclama-se
vítima das artimanhas do político, que fecha os ouvidos para ele, vira-lhe as
costas, e o despreza, afinal, já está eleito, e a sua, da dele, político, carreira
garantida. E o eleitor insulta o político, trata-o como traidor, desleal,
infiel, mentiroso e arrogante.
O político e o
eleitor se merecem, e se batem, e se amam, e se odeiam, e querem se matar,
causar um a extinção do outro. Merecem-se o político e o eleitor? Merecem-se?
São farinhas do mesmo saco o político e o eleitor? Como avaliar a relação
promíscua entre eles? Relação cínica? Relação de dissimulados? Por que o político
pede ao eleitor o seu, dele, eleitor, voto? Por que o eleitor concede o seu
voto ao político? Por que o político quer governar o eleitor? Por que o eleitor
deixa-se governar pelo político? Por que o eleitor admite tirar do próprio
bolso uma parcela do seu dinheiro obtido com a força de seus braços - para
esclarecer: a força de seus braços empregados em labor diário extenuante (e os
políticos extraem o seu ganha-pão... - ganha-pão? Não. É ganha-filé-migon,
ganha-caviar - não com a força de seus braços, mas, sim, com a força - da lábia
eu diria, e não corresponderia à verdade - com a força, dizia eu, da propaganda
e da imprensa venal) - o eleitor, prossigo, tira de seu ganha-pão, obtido com a
força de seus braços e com o suor de seu rosto, uma parcela, e a entrega para o
político – que é muito bem remunerado, e escasso lhe é o trabalho - para que
este se lhe intrometa na vida, crie-lhe dificuldades, inflija-lhe sofrimento, e
depois lhe solicita - exige? - confiança para resolver-lhe os problemas e
reduzir-lhe o sofrimento. Antes do pleito eleitoral, o político afaga o
coração, a mente, a alma do eleitor. Canta promessas, e promessas, e promessas;
depois, se eleito, é avassalado por uma onda gigantesca de amnésia. Indagado
pelo eleitor a respeito das promessas, puxa pela memória, e, inacreditável!,
esquece-se delas, e pergunta-se se lhas fez, ou se ele, eleitor, confundiu o
seu, dele, eleitor, sonho com a realidade, e ouviu o que nunca lhe foi dito, e
acredita, sinceramente, ter ouvido o que não ouviu, fundidas na sua mente a
fantasia e a realidade. E o eleitor, desiludido, sente-se traído, mas
esquece-se que, vaidoso, incauto, imprevidente, fez-se de cego aos alertas que
o seu instinto de cidadão de um país livre e democrático dera-lhe, e atirou-se
à toca do lobo. E agora, reclamar para quem!? Para o bispo? Clamará aos céus por
ajuda?
O eleitor é
dissimulador nato, astuto inigualável; por despreparo, ingenuidade, vaidade,
arrogância, confiança desmesurada em si mesmo, comete erros absurdos, e
arrepende-se, tarde... Ou jamais se arrepende, nem sequer reconhece os erros
que cometeu, e não os quer conhecer; prefere ignorá-los, e imputar ao político
toda a malvadez.
A
irresponsabilidade do político e a negligência do eleitor no exame das
peculiaridades e das idéias dele podem provocar o caos em uma sociedade,
precipitar um país na anarquia.
Diz o ditado:
É melhor prevenir do que remediar. Temos de nos perguntar: É impossível
prevenir-se das afecções políticas e dos desmazelos e desmandos do político?
Presume-se que não o seja; é possível, certamente, diminuir a influência da
megalomania, da irresponsabilidade, das idéias desarrazoadas de um político despreparado,
ou mal intencionado. Há político que não seja mal-intencionado? O político
almeja o aumento do seu poder, pretende exercer controle sobre a vida de todos.
É fruto tal postura de má-fé, intrínseca ao político, ou de um desejo sincero
de conceder melhorias à vida a todos? É possível ser bom oprimindo os que
deseja ajudar, cerceando-lhes a ação, impondo-lhes limites à liberdade?
O futuro não
existe; portanto, prever o que se dará após o sufrágio universal, antes de se
conhecer o político que ocupará a cadeira do poder é tarefa que está além das
faculdades dos profetas. O político, candidato, sendo um indivíduo, possui uma
biografia - mesmo que ninguém a tenha escrito (e é ingenuidade acreditar na
autobiografia de um político) -, que é pública, e está à mão do eleitor. Então,
por que o eleitor se satisfaz com o que o político diz de si mesmo e com o que
vê na propaganda? Por que se deixa o eleitor ludibriar tão facilmente?
Ludibriando-se, é ludibriado? O político pode iludir o eleitor instruído? O que
é instrução? Por que o eleitor deposita confiança no político, e com que
propósito?
Enquanto a
Terra segue o seu rumo, e no Brasil ainda se respira liberdade democrática - e
oxalá não caiamos na vala comum das ditaduras totalitárias comunistas, em sua
vertente bolivariana, da América Latina (ou Pátria Grande, como almejam os
comunistas) -, assisti-se, neste país, às promessas, aos logros, às
maledicências, ao uso individuo de recursos públicos... E o político e o
eleitor a coexistirem em uma oscilante e volúvel amizade...
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