quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Quatro histórias

 



- Você tem de se trancar na sua casa, e dela não sair até não sabemos quando.

- Não poderei trabalhar?

- Não.

- Mas é do trabalho que tiro o sustento da minha família e o meu. Não tenho um tostão em casa. Na geladeira há apenas um litro de leite e na dispensa um quilo de arroz e um pote com meio quilo de feijão, e quatro, cinco pães... E só.

- Não saia da sua casa. Se sair, morrerão doentes você, sua esposa e seus filhos.

- Se eu não sair, para trabalhar, ganhar o meu sustento para comprar comida morreremos de fome meus filhos, minha mulher e eu.

- Não saia da sua casa.

- Você me dá uns trocados para o leite das crianças?!

- Não saia da sua casa, até segunda ordem.

- Você me impede de trabalhar para o sustento da minha família e o meu e não me oferece ajuda, e se considera um benfeitor da humanidade?!

- Não saia da sua casa.

- Mas não tenho...

- Não saia da sua casa.

- Mas...

- Não saia da sua casa.


*


No consultório do cardiologista.

- Bom dia, doutor.

- Bom dia.

- Doutor, estou sentindo umas palpitações no coração. Sei não, acho que estou com um pé na cova. Meu querido coração 'tá pra pifar, já, já.

- Não se desespere. Podemos remediar. Aqui o pedido de exames. Faço-os, e traga-me os resultados.

Dias depois.

- Bom dia, doutor.

- Bom dia.

- Aqui, os resultados dos exames.

- Deixe-me vê-los - e tira-lhos das mãos.

- E então, doutor, o que tenho?

- Nada grave. Você apresenta os primeiros sintomas de uma deficiência cardíaca. Aqui, a receita - e entrega-lha.

- Mas... Mas... Mas... Doutor, aqui o senhor me diz para eu ir para casa, tomar vinte gotas de analgésico duas vezes por dia, e só procurar o senhor quando eu tiver uma parada cardíaca!!!


*


No consultório médico.

- Doutor, eu 'tô preocupado. Sabe, doutor, não sou santo. Tenho uma vida promíscua, e fiz muita besteira. Muita. Se eu contar para o Calígula o que já fiz, ele fica vermelho de vergonha. Eu já tive relações sexuais com homens, com mulheres, com jaguatiricas, com cadáveres de porco, com samambaias e com pepinos. Sei não, tem algo de errado, muito errado, comigo. 'tô me sentindo muito fraco, sem disposição para o que quer que seja. Acho que 'tô com AIDS.

- Não se preocupe, camarada. Faça um exame. Aqui, o pedido.

- Obrigado, doutor. Assim que eu tiver o resultado, voltarei.

- Estarei esperando.

Horas depois.

- Aqui, doutor, o resultado do exame.

- Deixe-me vê-lo. Você estava certo. Você tem AIDS.

- E agora, doutor?!

- Darei a você uma receita. Siga as orientações, e a história terminará bem. Tome. Pegue a receita.

- Mas... Mas... Doutor, aqui, o senhor me diz para eu ir para a minha casa, e tomar quarenta gotas de analgésico uma vez por dia, e só procurar o senhor quando eu estiver com 90% do meu organismo comprometido!!!


*


No consultório do pediatra.

- Bom dia, doutor.

- Bom dia, minha senhora. Tudo bem? E o meninão, 'tá bem?

- Doutor, ela 'tá com diarréia. Ontem, e hoje. 'tô preocupada.

- Vamos ver o garotão.

E o médico examina o menino.

- Não se preocupe, minha senhora. Daremos um jeito. Aqui, a receita.

- 'brigada, doutor.

- Não há de quê.

- Doutor, 'pera um pouco.

- Alguma dúvida?

- Na receita, o senhor me diz para ir para a minha casa, e dar para o meu bebê, três vezes por dia, dez gotas de analgésico, e só procurar pelo senhor quando meu bebê estiver fraquinho, fraquinho, quase morrendo, e cagando sangue!!

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