quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Quato notas

 Ocorre, às vezes, de um policial despreparado, vir a, trocando os pés pelas mãos, causar lesões em alguém inocente, até mesmo matá-lo. Sempre que tal ocorre, a imprensa está pronta, sempre, para espalhar a imagem das cenas grotescas para os quatro cantos do mundo, vezes sem conta, dando a impressão que ocorreu milhares de casos, simultaneamente, e não apenas um. E intelectuais descarregam, de imediato, sem que alguém lhes peça a opinião, o ódio que sentem pelos policiais e o amor que têm pelos bandidos.

Quando ocorre de criminosos matarem policiais, a imprensa e intelectuais, quando não se calam, fazem do bandido vítima, além da sociedade, dos policiais, e estes os eternos vilões da história.


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Se uma reportagem dá notícia de crimes cometido por um político que não conta com a minha simpatia, devo verificar se é verdadeira, ou falsa, a notícia, ou de imediato adoto-a como verdadeira?


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Fake news - em português de Camões, notícia falsa - é toda notícia que não me agrada, ou a que é deveras falsa?


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Devo considerar Discurso de Ódio toda objeção ao meu pensamento?


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Imprensa não é tribunal. Reportagem jornalística não é prova criminal.

Se entendermos que as reportagens jornalísticas trazem a verdade, e nada mais do que a verdade, e se aceitarmos que elas servem de provas incriminadoras, toda pessoa pode ser condenada à prisão por crimes que não cometeu. Exagero? Então vejamos: João e José, inimigos viscerais, querem ver um a caveira do outro. João paga para o jornalista A publicar no jornal B cinco reportagens jornalísticas com notícias de crimes que José cometeu. E José é preso. Para se vingar de João, José paga para o jornalista C publicar no jornal D oito reportagens jornalísticas com notícias de crimes que João cometeu. E João é preso. Nota de rodapé: Nem João, nem José, cometeram crimes. Os dois são inocentes. Mas reportagens jornalísticas contam a verdade, e nada mais do que a verdade, e servem de provas que incriminam os réus...


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Sempre que ocorre de um policial matar alguém, jornalistas, intelectuais, artistas e juristas condenam o policial ao fogo do inferno. Quando criminosos matam inocentes, crianças inclusive, ouve-se silêncio tumular, e nem à família da vítima jornalistas, intelectuais, artistas e juristas enviam uma nota de pesar.


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Quem estuda, e com seriedade, um determinado assunto, dedica-se a conhecer, dele, as principais correntes de pensamento.

Se uma pessoa se debruça sobre um momento da História do Brasil, por exemplo, o regime militar, tem ela de ler obras de apologistas dos militares, de oponentes dos militares e dos que se mantêm (ou esforçam-se por se manter) equidistantes dos dois grupos principais (os militares e os seus inimigos) que se digladiaram durante o regime militar. Se se dedica unicamente a compulsar livros e a acessar documentos que reforçam sua idéia preconcebida acerca do regime militar, então ela não está a estudá-lo. Tem o estudioso boa-vontade para ler documentos que vão de encontro à idéia que faz do assunto ao qual se dedica, e, principalmente, se sua idéia, à luz de documentos, revelar-se errada, reconsiderá-la, e não, para conservá-la consigo, negar-se a reconhecer a veracidade do que eles lhe revelam.

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