sábado, 18 de dezembro de 2021

Quatro filmes

 Poirot - série de televisão - episódio 1, temporada 1 - A Aventura da Cozinheira de Clapham (Agatha Christie's Poirot - The Adventure of the Clapham Cook - 1989)


Recorre ao detetive Hercule Poirot (David Suchet) a senhora Todd (Katy Murphy), preocupada com o desaparecimento de Eliza Dunn (Freda Dowie), sua cozinheira, e solicita-lhe que investigue o caso. De início, o famoso investigador belga recusa-se a empreender tal aventura, que, segundo ele, está muito aquém de seus talentos inigualáveis. Diante da persistente senhora Todd, um tanto quanto constrangido, e despeitado, a secundá-lo Arthur Hastings (Hugh Fraser), Poirot decide atender-lhe o pedido, e não demora para ir até a residência dela, e executar um exame minucioso do local. E dá tratos à bola. Logo vem a saber, usando de um artifício sutil, onde encontrava-se Eliza Dunn, vai até ela, e com ela mantêm uma palestra esclarecedora, vindo a saber, então, da existência do personagem chave do caso, certo de que ele, além de ludibriá-la com uma história sedutora, preparava viagem para a Bolívia. O caso que Hercule Poirot Investiga cruza-se, por obra do destino, com o qual o inspetor chefe Japp (Philip Jackson) ocupava-se. Estranham-se os dois investigadores. E não demora para que eles se entendam. E resolvem-se os dois casos. E é na iminência do encerramento da trama, que Poirot, intrigado, diante de uma surpresa que o incomoda, a suspeitar que se enganara, relembra um detalhe, que quase lhe escapara, e que lhe coça o cérebro, e que lhe permite chegar à solução para o caso que investigava.

O criminoso iria para a Bolívia, ou para outro país da América do Sul?

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Poirot - série de televisão - A Caixa de Chocolates - episódio 6, temporada 5 (Agatha Christie's Poirot - The Chocolate Box - 1993)


Está Hercule Poirot (David Suchet), num restaurante, na companhia de um querido amigo, Chantalier (Jonathan Hackett), e do inspetor chefe Japp (Philip Jackson), a reconstituir, nostálgico, um antigo caso, que havia investigado, quando cruza seu caminho o conde Xavier St. Alard (Geoffrey Whitehead), seu desafeto. Hercule Poirot, após evento tão constrangedor, segue a narrar o antigo caso para o inspetor Japp e para Chantalier, e é um dos personagens de tal história Xavier St. Alard, homem sobre o qual o detetive mais famoso da Bélgica havia lançado suspeitas infundadas. Tal episódio da vida de Hercule Poirot se deu quando era ele um aspirante à oficial. Sua intuição o havia impelido a contrariar uma ordem de seu superior, e a dedicar-se a investigar a morte de Paul Deroulard (James Coombes) após testemunhar, em um tribunal, Virginie Mesnard (Anna Chancellor) levantar-se para clamar aos quatros ventos que Paul Deroulard, viúvo de sua prima Marianne Deroulard (Lucy Cohu), não havia morrido devido ao infarto que, concluíra-se, lhe ceifara a vida. E dedica-se Hercule Poirot à investigação, e com sua proverbial perspicácia de investigador, que não se revela infalível, depara-se com detalhes que lhe apontam uma explicação para o caso que não corresponde à conclusão a que chegara a polícia ao fim de suas investigações. Uma caixa de chocolates pôs-se no caminho de Hercule Poirot; e os restos de chocolate reunidos no fundo da caixa ele os levou a um amigo, para que este os examinasse à procura de veneno. Depois de se deparar com alguns contratempos, e saber que se equivocara em certas respostas que dera a algumas perguntas que havia aventado, e manter um relacionamento platônico com Virginie Mesnard, Hercule Poirot conclui as investigações, o caso da morte de Paul Deroulard esclarecendo-se, e, por consequência, o da de Marianne Deroulard. Ao fim, encerrado o relato do antigo caso, o filme prende-se ao tempo presente. E após muitos anos encontra-se Hercule Poirot com Virginie Mesnard, mulher de sorriso deslumbrante, que tanto o havia cativado.

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Poirot - série de televisão - episódio 5, temporada 3 - A Tragédia na Mansão Marsdon (Agatha Christie's Poirot - The Tragedy at Marsdon Manor - 1991).


Chamado à vila de Marsden por um dono de um hotel, Samuel Naughton (Desmond Barret), que lhe solicita ajuda na investigação de um caso policial, caso inusitado e intrigante, Hercule Poirot (David Suchet) - a acompanhá-lo o capitão Arthur Hastings (Hugh Fraser) -, ao receber das mãos dele papéis com o relato do caso, com todas as minúcias, e inteirado de sua natureza, contrariado, e visivelmente irritado, rejeita a proposta, mas, instado por Samuel Naughton, dedica-se a investigá-lo, e em pouco tempo, com pouca, ou nenhuma, dificuldade, resolve-o. E fala de sua descoberta a Samuel Naughton. E diz-lhe quem é o autor do crime. E chega aos ouvidos do êmulo de Sherlock Holmes notícia da morte de Jonathan Maltravers (Ian McCulloch). E dedica-se o investigador a estudá-la. Visitara, pouco antes, uma casa de bonecos de cera, onde, ao encerramento do filme, já concluída a investigação, dá-se uma cena de humor divertidíssima, que só não é mais divertida do que a história - esta, impagável - que Samuel Naughton protagoniza. No princípio da investigação do caso da morte  de Jonathan Maltravers, contam-lhe a triste história da morte trágica de uma mulher, que havia saltado, para a morte, do alto de uma árvore, e cujo fantasma aterrorizava Miss Robinson (Anita Carey). Movido por sua inigualável perspicácia, não acolhe de imediato a conclusão dada ao caso. Intrigado, e a secundá-lo o capitão Arthur Hastings e o inspetor-chefe Japp (Philip Jackson), investiga-o até chegar à resposta certa. E a verdadeira causa da morte de Jonathan Maltravers vem à tona.

A trama é simples; mais do que ela, e a recriação do ambiente da época em que se dá a história, o que mais me agradou foi o cômico Samuel Naughton, personagem divertidíssimo.

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As Aventuras de Sherlock Holmes - série de televisão - Os Seis Napoleões (The Adventures of Sherlock Holmes).


Sherlock Holmes (Jeremy Brett) e seu fiel escudeiro, o doutor John Watson (David Burke), investigam o caso de invasões de residências por um homem que furtava bustos de Napoleão Bonaparte e quebrava-os à marteladas.

No início, Pietro Venucci, atrabiliário, verborrágico, escandaloso, discute com sua irmã, Lucrezia, na presença do pai de ambos, desanca-a, ofende-a, humilha-a com insultos impublicáveis, e encara seu pai, que lhe ordena o fim das ofensas à irmã, e vai, passos firmes, até onde se encontra Beppo, o homem que a desonrara, e ameaça-o. E os dois homens lutam, com facas. Beppo esfaqueia Pietro, que sobreviveria, e foge, e adentra um depósito de estatuetas, onde há, dentre muitas, as seis que representam Napoleão Bonaparte. Policiais o capturam, e prendem-lo.

O que havia em tais estatuetas, que despertava o interesse obsessivo de quem as furtava das residências, e, à marteladas, as reduzia à pó? Intrigava o mistério Sherlock Holmes, que se dedica à investigação do caso até seu término. E ao final, dá-se a explicação da trama assim que o morador do número 221B da Baker Street tem às mãos dos seis bustos de Napoleão o único que não havia sido quebrado. O que havia nas estátuas de tão valioso?


terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Um filme

 O Homem-Morcego (The Bat - 1959) - com Vincent Price


Em uma antiga mansão ocorrem crimes inusitados. É a mansão propriedade de John Flemming (Harvey Stephens), cujo sobrinho, Mark Flemming (John Bryant), aluga-a para Cornelia van Gorder (Agnes Moorehead), escritora de tramas policiais, famosa e popular e admirada, que na mansão vive com Lizzie (Lenita Lane), sua governanta, e Warner (John Sutton), seu mordomo. Espalha-se que nos arredores comete crimes horrendos um homem vilanesco e crudelíssimo que atende pelo codnome Morcego.

Estão numa casa, num campo, John Flemming e o doutor Malcolm Wells (Vincent Price), e aquele a este revela um segredo: roubara, de seu próprio banco, um milhão de dólares, em títulos bancário, e escondera-os na mansão. O doutor Wells, a excitá-lo a ganância, mata John Flemming, e faz queimar a casa com fogueira que pode ser vista à distância. Espalha-se a notícia. E não demora muito tempo, o Morcego invade a mansão do Flemming, onde estão a escritora, sua governanta e seu mordomo, e os ameaça. É chamado para investigar o caso o tenente Andy Anderson (Gavin Gordon), que decide permanecer na mansão para proteger os inquilinos. No desenrolar da aventura, os olhares de suspeitas entre o tenente e o doutor Malcolm Wells, e os diálogos entre eles, dão a entender que o tenente dele desconfia, e recai sobre o doutor todas as suspeitas, afinal, ele, ciente do ato criminoso de John Flemming, matara-o. E as descobertas que faz o tenente das pesquisas do doutor Wells com morcegos e das desconfianças que o mordomo lhe inspira, e as atitudes e insinuações entre os personagens revela-se que são três os suspeitos de envergarem a vestimenta do Morcego e usarem, na mão esquerda, uma luva preta com garras de aço: Warner, o mordomo; Andy Anderson, o tenente; e, Malcolm Wells, o médico. Quem dentre eles é o temido Morcego, vilão cruel e sanguinário? Ou é o Morcego personagem que habita os pesadelos da escritora e de sua governanta? E onde estão os títulos bancários que John Flemming dissera haver roubado de seu banco? Existem?

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Um filme

 O Monstro da Lagoa Negra (Criature from the Black Lagoon - 1954). - direção: Jack Arnold


É este filme um distante ancestral de Anaconda, que conta, no seu elenco, com a bela Jennifer Lopez, e Jon Voight, que faz a vez de um canastrão grotesco.

É O Monstro da Lagoa Negra um filme desprovido de atrativos. Conta a história de um pequeno grupo de exploradores que, após o doutor Carl Maia (Antonio Moreno) encontrar o esqueleto de uma bem conservada mão de um animal desconhecido, antiquíssimo, de era anterior à do primeiro homem que pisou na Terra, vai, a bordo do barco Rita, pelos rios da Amazônia brasileira, até a misteriosa Lagoa Negra, onde vivia o Homem-Peixe, criatura lendária e temida. Compõem o grupo de aventureiros, além do doutor Carl Maia, o mergulhador David Reed (Richard Carlson) e sua mulher Kay Lawrence (Julie Adams), e o empresário Mark Williams (Richard Denning), e o dono do barco Rita, Lucas, e os ajudantes deste.

No início do filme, o monstro, saído da água, ataca dois auxiliares do doutor Carl Maia; e no decorrer da história, mata alguns outros personagens, dentre eles Mark Williams. O filme é pobre em efeitos visuais, tem cenas desnecessárias, que estão no filme unicamente para encher linguiça, em especial as que exibem David Reed e Mark Williams a explorarem o fundo do rio e a que a bela Kay Lawrence exibe, nas águas, a sua destreza de nadadora, só, tranquilamente, em um rio fundo, numa floresta praticamente inexplorada. Há uns atritos entre os personagens centrais, comuns em filmes do gênero, o empresário ambicioso, ganancioso e inconsequente, surdo à voz da ciência, e o cientista, abnegado, a pensar exclusivamente no progresso da ciência.

E o monstro, o terrível , assustador monstro da Lagoa Negra? O que dele posso falar? É ele um nadador exímio; suas evoluções submarinas, de um desenvolvimento único. Está bem adaptado à água. E ele rapta a bela Kay Lawrence, e carrega-a consigo até sua morada. É o monstro um homem vestido com uma fantasia de um bicho misto de peixe, batráquio, anfíbio e sei lá mais o quê.

É O Monstro da Lagoa Negra uma peça curiosa. Dele ouvi falar ainda em minha não muito distante infância. Apareceu-me por acaso diante de meus olhos, dias destes, assim que acessei o Youtube. E curioso, ao filme assisti.

Para encerrar esta curta resenha, digo: A idéia que o doutor Carl Maia esposa, após vir a saber da existência do homem-peixe, era muito comum, entre os cientistas, no crepúsculo do século XIX e no alvorecer do XX: nas regiões isoladas do mundo talvez animais pré-históricos existissem. Esta idéia inspirou a Arthur Conan Doyle o tema do livro O Mundo Perdido.


sábado, 20 de novembro de 2021

Um conto

 Olímpiadas 2.052: O Último Atleta Atlético.


Notícia do Jornal Paraíso do Universo Novo, edição vespertina: A Humanidade Livrou-se da Última Quimera.

Realizou-se, hoje, às oito da manhã, no estádio A..., a mais aguardada prova do atletismo global, a dos cem metros rasos, da qual participaram três atletas de beleza mesmerizante e um exemplar de uma era que exala os seus últimos suspiros, de uma era que, para a felicidade dos humanos, está nos estertores da morte. Neste memorável dia, em todos os cantos do mundo, bilhões de pessoas assistiram a tão desejado espetáculo esportivo, evento grandioso que, além de apresentar ao mundo três esportistas excepcionais, os maiores que a civilização humana jamais conheceu, exibiu uma anomalia da natureza, um ser bizarro, comum na era incivil e bárbara, bruta e estúpida, que se esvai rapidamente, e está próxima a sua extinção, Tlob Niasu, um homem dotado da nefasta masculinidade tóxica. É Tlob Niasu um ser monstruoso, disforme. Tem um metro e oitenta e cinco centímetros de altura, e pesa oitenta e oito quilos; seu corpo, horrivelmente ossudo; sua figura, hedionda, de provocar asco em todas as pessoas. É ele uma criatura horripilante, de braços e pernas recortadas de músculos monstruosamente definidos, músculos a constituírem uma grotesca estátua de carne, e de um tronco desprovido da flacidez das belas e formosas pessoas do nosso tempo. É Tlob Niasu um espécime de tipos humanos de uma era que os humanos desejamos esquecer; é ele de uma era fadada à extinção - para a felicidade e a harmonia universais. É ele o último exemplar do tempo de irracionais bípides implumes. Os outros três competidores são atletas notáveis, donos de invejáveis talentos atléticos e intelectuais, e psicológicos e espirituais. São eles 0/21/32-3, 6/33-3 e 0-0/6-30/8. São os três modelos perfeitos de beleza física. Tem 0/21/32-3 um metro e sessenta e cinco centímetros de altura; seu corpo é composto de uma espessa camada de gordura de uma beleza ímpar a formar dobras excepcionalmente belas; tão forte, tão poderoso, de uma força descomunal, carrega os duzentos e quarenta e seis quilos de seu corpo com a destreza do deus da velocidade; nas suas coxas poderosas, as camadas sobrepostas de rica gordura sob pele de textura macia cobrem suavemente os joelhos. 6/33-3, homem de corpo esférico, desprovido de pescoço, é de uma robustez e poder titânicos de embasbacar todo ser mortal; os seus duzentos e sete quilos compactados num corpo de um metro e cinquenta e quatro centímetros de altura dão-lhe uma consistência invejável. E o terceiro dos formosos atletas, 0-0/6-30/8, dos três o mais atraente, carrega um corpanzil extraordinariamente gracioso e bem torneado, de um metro e sessenta centímetros de altura e duzentos e sessenta quilos, adornado com um ventre bojudo, extraordinariamente saliente, belamente arredondado, como que esculpido pelo mais talentoso dos escultores. A beleza destes três maravilhosos e belos atletas contrastam com a feiúra apolínea de Tlob Niasu, um tipo repugnante, tipo que, felizmente, é o último espécime de uma era bárbara, a de nossos mais próximos ancestrais, seres inferiores, que muitos defeitos nos legaram, defeitos dos quais estamos a nos livrar, para o bem da humanidade.


Na pista de corrida, os três formosos e elegantes atletas e o bárbaro desgracioso, que exalava a sua monstruosa masculinidade tóxica da era patriarcal, que desconhecia a verdadeira essência da humanidade. Na arquibancada, multidão alvoroçada a ovacionar os três atletas e a apupar o bizarro bípede que insistia em exibir seu corpo seminu, desgracioso, repulsivo, de causar engulhos aos humanos. Exercitavam-se os quatro competidores, Tlob Niasu a erguer acima da cabeça os braços esquálidos e defeituosos, e a entrelaçar os dedos da mão direita com os da mão esquerda, e a mover o corpo esguio, desgracioso, de um lado para o outro, exibindo a flexibilidade corporal desavergonhada, e a estender as pernas, ora a direita, ora a esquerda, inclinando-se para a frente, e a segurar a ponta do tênis com as duas mãos, numa grotesca, asquerosa exibição de movimentos corporais, que lhe destacavam os músculos disformes do corpo esquálido. E 0/21/32-3 massageava, lentamente, com gestos suaves e elegantes, suas bochechas rechonchudas e rosadas e emitia, com sua bela voz de tenor, argentina, um canto melífluo; e 6/33-3, deitado, girava-se de um lado para o outro, compenetrado em bater, com a palma da mão direita a costa da mão esquerda, e com a palma da mão esquerda a costa da mão direita; e 0-0/6-30/8 careteava maravilhosamente e massageava, com movimentos circulares das mãos, as duas em sentido ora horário, ora anti-horário, ora cada uma seguindo um sentido, alternadamente, seu ventre formoso.

O árbitro da partida pediu aos quatro corredores que se aproximassem da linha de início, e Tlob Niasu, celeremente, numa postura deselegante, condenável, recompôs-se, correu até o ponto que lhe estava reservado, e, enquanto esperava os três atletas ajeitarem-se cada qual ao seu local de direito, saltitava, grosseiramente, a balançar, repulsivamente, seus músculos repugnantes. Vaiou-o a multidão presente. E ele, espécime bizarro de uma era bárbara, não se constrangeu; arrogante, persistiu em exibir sua grosseira agilidade e sua flexibilidade corporal desgraciosa. E os quatro competidores posicionaram-se cada qual no lugar que lhe estava reservado. E o árbitro da corrida disse-lhes que se praparassem para o início da prova, que se daria assim que o lenço branco, que ele segurava com a mão direita - e que ele soltaria - atingisse o chão. E o estúpido Tlob Niasu uma vez mais revelou-se um tipo desprezível, o que não surpreendeu ninguém; curvou-se para a frente, estendeu os braços, e pousou os dedos, as mãos abertas, os dedos distantes uns dos outros, no chão, sem no chão encostar as palmas das mãos, e estendeu a perna esquerda e dobrou a direita, preparando-se para correr. E o árbitro soltou o lenço; e o lenço atingiu o chão. E em menos de dez segundos, Tlob Niasu cobriu os cem metros, e rompeu a faixa vermelha que indicava a linha de chegada. Apuparam-lo todos os humanos presentes no estádio. Ridícula, patética, a atitude do bárbaro pretensioso. Ele ergueu os braços e sorriu, feliz, a cantar vitória, imerecida vitória. Os três atletas, numa postura digna e louvável, soltaram-se, elegantemente, no chão, e serenamente esbravejaram e esgoelaram-se, num misto de raiva e indignação, e liberaram de seus olhos belos lágrimas cristalinas, que reluziram ao sol. Dos organizadores da prova o público exigiu regras justas. Os organizadores da prova num erro imperdoável ao estabelecer regras que favoreciam, criminosamente, o monstruoso, disforme Tlob Niasu. Ao confabularem durante cinco minutos, reconheceram que outra corrida os quatro corredores teriam de realizar, agora sob regras justas, e desculparam-se com o público, num tom de voz que deles transparecia constrangimento. Ponderaram: 0/21/32-3 correra cinco metros e sessenta centímetros, e 6/33-3 cinco metros e setenta centímetros, e 0-0/6-30/8 cinco metros e sessenta e oito centímetros, no mesmo tempo que o desprezível portador de masculinidade tóxica, Tlob Niasu, cobrira os cem metros; a prova nova, portanto, atendendo aos princípios elementares da justiça, contaria com regras que não favoreceriam Tlob Niasu: assim que o árbitro soltasse o lenço, e o lenço atingisse o chão, os três exímios e talentosos atletas, 0/21/32-3, 6/33-3 e 0-0/6-30/8 correriam com toda a velocidade que suas poderosas e formosas pernas lhes permitiriam, e assim que atingisse, o primeiro deles, os noventa e cinco metros, o árbitro daria sinal para Tlob Niasu correr. E assim foi feito. E o bárbaro, desprezível Tlob Niasu, numa exibição asquerosa de sua masculinidade tóxica, ultrapassou os três heróicos atletas, e rompeu, antes deles, a faixa vermelha que indicava os cem metros. E os três atletas, com a elegância de movimentos que lhes fizeram a fama, soltaram-se, no chão, indignados, enfurecidos, e justamente indignados e enfurecidos, e gesticularam bravamente, os olhos marejados de lágrimas de descontentamente com a injustiça que os vitimou, e clamaram, heroicamente, por condições competitivas mais justas. E o público vaiou Tlob Niasu, que comemorava a vitória imerecida, vitória que obtivera sob regras injustas. A sua alegria não durou muito tempo; logo foi ele obrigado a suprimir do rosto o repulsivo, deselegante sorriso. Reuniram-se os organizadores da prova uma vez mais para deliberarem novas regras competitivas. Ao encerramento da palestra, ele anunciaram as novas regras, estabelecidas após reconhecerem que não haviam, ao definirem as regras da segunda corrida, um detalhe, que não consideraram na equação: os três ágeis atletas se esgotariam durante o esforço de correrem os noventa e cinco metros, perderiam fôlego, desacelerariam o avanço rumo à vitória, e não correriam os cinco últimos metros da prova em tempo que lhes permitisse sobrepujar, em condições de equivalência competitiva, o adversário horrível e inescrupuloso, Tlob Niasu, resquício horripilante de uma era bárbara, incivil.


Agora, estabelecia-se a regra justa: 0/21/32-3, 6/33-3 e 0-0/6-30/8 principiariam a corrida, após o lenço que o árbitro soltaria, atingir o chão, na linha que indicava noventa e nove metros da pista, um metro antes da linha de chegada, enquanto o desprezível Tlob Niasu principiaria a sua jornada rumo à humilhação pública no ponto inicial. O público vibrou de emoção, eufórico. Assobiaram, felizes, alegres, contentes, as pessoas presentes na arquibancada. Elas reconheceram a justeza das regras. Aplaudiram, estrondosamente, os organizadores da prova, homens que, enfim, dever cívico incontornável a iluminar-lhes a mente, elaboraram regras justas, humanitárias. E deu-se a largada. E os três fenomenais, excepcionais atletas sobrepujaram, com incrível, impressionante facilidade, o desgracioso Tlob Niasu, homem desprezível, dele exibindo para todo o mundo a ausência de talento para o exercício de esporte tão nobre.

Foi premiado com a medalha de ouro 0-0/6-30/8, com a de prata 0/21/32-3 e com a de bronze 6/33-3. Ovacionou-o o público alvoroçado, eufórico. E Tlob Niasu, de cabeça baixa, semblante entristecido, de um homem inferior, de um tipo desprezível, retirou-se do estádio, sob vaias tempestuosas da multidão, que aplaudia os três heróis do atletismo global.

Minutos após o encerramento do grandioso espetáculo esportivo, Tlob Niasu reapareceu em público, exibiu sua carcaça putrefata, de homem incivil, horrível e repulsiva, de uma esqualidez cadavérica, repugnante, pálida, de olhos fundos, sem vida, e anunciou a sua aposentadoria. Disse, num tom de indisfarçado orgulho ferido, ególatra que é, que se recolheria à sua casa, e dela jamais se retiraria, e o fez num tom que dava a entender que os humanos, e não ele, perderíamos com tal decisão. E recolheu-se o ilustre ser das trevas aos bastidores. Oxalá ele jamais se exiba ao público! Os humanos não desejamos ter diante dos olhos a figura dele, figura disforme, anômala, que nos fere em nossa sensibilidade superior. O mundo estará melhor sem ele, e sem ele poderá progredir até atingir a perfeição à qual está predestinada.

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Um

 Paçoca de Amendoim e Pamonha de Milho


Confesso que não sei se o que eu envio para dentro de meu estômago voraz - glutão é meu estômago, e não eu - é o que eu acredito que seja. Não sou de acreditar na veracidade das informações inscritas nos rótulos dos produtos alimentares dos quais retiro substâncias, que não sei quais são, que me servem de energia para manter o corpo a funcionar a pleno vapor; aliás, eu sequer leio os rótulos; dos poucos que eu li, conclui que as informações que trazem coisa nenhuma me esclarecem, e de nada me servem; lendo-os, não venho a saber se são os produtos amargos, azedos, agridoces, se atendem ao gosto do meu paladar; sei, apenas, que são os produtos compostos de coisas, que eu não tenho a mínima idéia do que sejam, de nomes impronunciáveis umas, outras de nomes copiados dos de personagens de desenhos animados.

Há um mês comprei paçoca, e, assim que cheguei em casa, comi, dela (da paçoca, e não da minha casa), um bom bocado - estou a me perguntar desde então se os ingredientes dela eram amendoim, sal e açúcar, ou serragem, pó de carvão e fumaça de pedregulho. De amendoim sequer o cheiro eu senti. Que havia sal naquele pó, havia, acredito, mas não estou certo se era sal, mesmo, ou minúsculos cacos de vidro, do tamanho de grãos de areia. E se a pamonha que eu comi não sei há quantos dias era de milho, não sei. Pareceu-me aquela massa massa de modelar amarela - dessas com as quais as crianças do jardim-de-infância brincam - banhada em chá de inhame e batata, e os pedaços de queijo que a recheavam, poucos, giz encharcado. Esquecia-me: a mais famosa pamonha é a de Piracicaba. E o pão de leite que eu comi dia destes não continha leite, nem um pingo sequer, acredito. Eram os seus ingredientes, suspeito, cal, terra, pó de grafite e folhas de sulfite brancas desfeitas em água. E há não muitos dias comi um pedaço de rapadura, que era, assim penso, lama prensada, que se me tornou digerível após eu lhe adicionar uma boa quantidade de açúcar de cana, cana-de-açúcar, uma das riquezas brasileiras. E hoje mandei para dentro de meu estômago uma goiabada cujos ingredientes eram, presumo, chuchu - ou é com "x"? - berinjela - com "j" ou com "g", não sei -, casca de banana nanica, espiga de milho e fígado de boi (ou de vaca, sei lá).

Com o propósito de documentar para a posteridade aspectos da saudável culinária dos tempos modernos, registro, com a seriedade que me é habitual, as palavras que o leitor leu, com a atenção que o assunto pede, nas linhas acima desta. É este meu texto um documento de valor histórico, valioso, inestimável. E não posso encerrá-lo sem dizer o seguinte: Aquela coxinha de frango que na semana passada eu comi tinha jeito de ser uma perna de sapo.

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Quatro comentários

 Os seguidores da Ciência seguem qualquer coisa, menos a ciência. Histeria coletiva. Palavras e mais palavras. Aristófanes e os homens da lei. Notas breves.


Um bom punhado de pessoas, assim que, no distante ano de 2.020, ouviram falar sapienciais médicos e cientistas renomados, evoluíram, de homo sapiens para homo seguidoris cientificus - que me perdoe o leitor o péssimo latim, que é dos latinos, e não meu -, Seguidores da Ciência, em vernáculo. A imprensa elevou, estamos cientes, aos píncaros da notoriedade certos médicos e cientistas, uns quatro, ou cinco, e atribuiu-lhes dons supremos, infalibilidade. E de tanto ouvirem tais sumidades descarregarem, usando de um vocabulário pra lá de estrambótico, que ninguém entendeu, mas todos fingiram que entenderam - todos, aqui, são os homo sapiens que ambicionaram a evolução que viriam a sofrer -, tempestuosamente platitudes sem fim, ou coisa que o valha, os homo sapiens que passavam por um ligeiro processo evolutivo introjetaram, conscientemente, suponho, os conhecimentos superiores que delas ouviram, aprenderam a rejeitar negacionismos, dando mostras inegáveis de que estavam predestinados a superarem a sua natural condição homosapiensnica - que neologismo escalafobético - e a enfiarem o dedo acusador no nariz dos seres humanos inferiores fadados a viverem eternamente - enquanto vivos, é óbvio - sob o domínio de sua homosapiensticidade (Hoje eu 'tô demais; é este o segundo neologismo que invento em menos de cinco minutos). Na prática, recusaram-se a dedicar um pouco, um pouco que fosse, de sua atenção às vozes dissonantes e a ponderarem a respeito das objeções que eles aventaram. Excitados pelos pronunciamentos das celestiais autoridades midiáticas, médicos e cientistas eleitos pelos donos do poder, que impuseram uma visão única do fenômeno epidêmico - real, ou não, não vem, aqui, ao caso -, arvoraram-se defensores legítimos do debate democrático, livre, franco, aberto, e declararam-se dispostos à controvérsia. Verdade seja dita, primeiro eles rotularam de nazistas, fascistas e genocidas os que não assinaram embaixo dos documentos chancelados pelos sábios de plantão e recusaram-lhes acesso aos canais de comunicação, e assim, eliminando-os do debate público, fizeram valer a verdade homoseguidoriscientificusênica (e aqui vai o meu terceiro neologismo). E clamam aos quatro ventos que venceram o debate público. Qual debate público? O que nunca existiu.

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Ainda persiste a histeria coletiva que a imprensa e a internet criaram nestes meses de domínio do protagonismo do coronavírus no cenário midiático e político global. Impressiona a facilidade com que as pessoas abandonaram - as que a possuíam - a razão para adotar, mecanicamente, o discurso predominante, que foi sendo alterado numa sucessão de narrativas sem pé nem cabeça. No início, dizia-se que era o vírus velocíssimo, a mover-se numa velocidade hipersônica, e de baixa letalidade; daí a necessidade de se impôr uma política de quinze dias de quarentena para se desacelerar a transmissão do vírus entre os humanos e dar tempo para os órgãos públicos de saúde prepararem hospitais para acolherem a enxurrada de doentes infectados pelo vírus. E depois destes quinze dias, era o que se dizia então, o vírus seguiria o seu curso natural, e as pessoas saudáveis infectar-se-iam, até se atingir a imunidade de rebanho, natural. As pessoas assumiram o compromisso de praticarem certas atividades, apropriadas, que contribuiriam para a contenção da transmissão do vírus. E fim. The end. E todos viveriam felizes para sempre. Mas de repente, mais que de repente, alterou-se a narrativa. Tinham, agora, todas as pessoas de se conservarem indefinidamente trancafiadas em suas casas até que se produzisse a vacina, pois a imunidade natural inexiste, ou é, existindo, inútil. E aceitou-se tal narrativa, o novo consenso científico entre médicos e cientistas, quatro, ou cinco, escolhidos a dedo, que apresentaram ao admirável público, tão receptivo, tão sugestionável, a boa nova. E menciono outro ingrediente da narrativa: nenhum remédio, pois remédios provocam efeitos colaterais, podia ser administrado aos humanos já infectados pelo vírus. E poucos foram os que se perguntaram quanto tempo teríamos de esperar pela vacina milagrosa, e o que aconteceria com as pessoas que subsistem de venda de balas-de-goma, paçoca, bugigangas, nas praças, e cuja renda lhes dá meios para a aquisição da refeição de um dia, apenas para a da de um dia, e se apenas os remédios indicados para uso contra o vírus ao qual se atribui todos os males que nos afligem provocam efeitos colaterais nas pessoas que deles fazem uso. O terror psicológico, de assustar. Muitas pessoas viram o vírus em todo lugar, e o viram porque não o podiam ver. A imaginação, em estado de histeria, fê-las vê-lo, e vê-lo com a figura de uma criatura monstruosa, escatológica.

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Com a ressignificação das palavras enfia-se novas idéias na cabeça de todos, idéias que não correspondem ao objetivo real dos que ressignificam as palavras e o qual o público rejeitaria se apresentado com as palavras conservados os seus significados correntes; é o objetivo alegado dos ressignificadores de palavras benéfico, sempre; e o verdadeiro, inconfessado, oculto, maléfico. Ao se dizer "controle de natalidade" e "aborto de feto" está-se a dizer, ensina o discurso oficial, que se faz urgente uma política social, pública, para se evitar o esgotamento dos recursos naturais, e, consequentemente, o colapso da civilização, e, o mais preocupante, a aniquilação dos seres vivos e a destruição da Terra; mas o que se esconde com tal palavreado do público desavisado é a política, a real, de assassinato de crianças, de dessensibilização dos humanos, de promoção da cultura da morte, do hedonismo, de uma cultura anárquica, suicida. Ao se dizer "amor intergeracional", defende-se - é o discurso oficial - o sentimento amoroso (entenda-se, relações sexuais) entre adultos e crianças, sentimento que se deve compreender e respeitar; mas está a se promover a violência, o abuso, a exploração sexual de jovens e de crianças. São belas as palavras de tolerância, de respeito, de luta contra os preconceitos e os tabus. Vende-se gato por lebre. Em nome do combate ao machismo promove-se o ódio ao homem  - daí o discurso contra a "cultura do estupro" e a afirmação "todo homem é um estuprador em potencial" e a condenação da "masculinidade tóxica" (daí afirmarem que todo homem é violento, selvagem, incivil, uma ameaça à civilização). Na luta contra o racismo, sustenta-se o ódio mortal pelo homem branco. Em defesa das mulheres, com palavras melífluas, além de justificarem o ódio aos homens, enobrecem o mal que se faz às mulheres. Ressignificando-se as palavras são atos anti-democráticos as manifestações pacíficas de bolsonaristas; e manifestações pela democracia, livres e espontâneas, populares, revoltas e sublevações violentas que jogam policiais feridos, nos hospitais, às portas da morte, e deixam casas a arderem em chamas e, destruídos, prédios públicos e privados. E é aliança pela democracia e contra o fascismo a associação de criminosos contra o povo honesto e trabalhador.

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Aristófanes, dramaturgo que viveu, há dois mil e quatrocentos anos, na Grécia, não tinha em alta conta os homens das leis. Em As Vespas ele exibe o seu desprezo por tal gente. Sem papas na língua, ferina, corrosiva, rididulariza juízes, que atuam, segundo ele, não em benefício da Justiça, mas de si mesmos, a salvaguardarem os seus privilégios e os dos poderosos que os sustentam. E as exceções confirmam a regra. Ontem e hoje.

sábado, 13 de novembro de 2021

Três textos

 Bolsonaro, o iconoclasta. Bolsonaro, o herege. Desmascarados. Notas breves.


E o Bolsonaro, hein!? Ele se recusa a idolatrar os novos sacerdotes, cuja indumentária resume-se a jaleco branco, sapatos brancos, meias brancas; roupas brancas, enfim. E ele não se dispõe a entrar, e humildemente, de cabeça baixa, nos novos templos sagrados, os laboratórios farmacêuticos, e prosternar-se diante da Santa Vacina. Herege! Ímpio! Iconoclasta incivil! Impio! Ele rejeita o decálogo cientificista desumanizador.

*

E na Europa Bolsonaro, o herege confesso, não-vacinado, num tetê-a-tetê com ninguém mais, ninguém menos, que Tedros Adhanom. Ambos sem máscara. E acompanhados de outros personagens, todos sem máscara.

Nas últimas reuniões de líderes mundiais o que mais se viu foram homens poderosos, todos sem máscara, em ambientes fechados, a abraçarem-se, a confabularem sem respeitar o distanciamento social, a divertirem-se, e a zombarem da cara de todas as pessoas que se sacrificam pelo bem comum - assim pensam os abnegados cidadãos responsáveis que neste tempo dramático arvoraram-se autoridades morais.


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Descer para baixo e subir para cima.


- Eu, então, desci para baixo...

- Desceu para baixo!? Mas é para baixo mesmo que se desce.

- Nem sempre.

- Que!? Desce-se para cima!? Não me diga que, além de se descer para cima, sobe-se para baixo.

- Digo.

- Então diga.

- Eu, ontem, desci para baixo...

- Não precisa dizer que desceu para baixo, pois sempre que se desce desce-se para baixo.

- Ontem, deixe-me falar e preste atenção, besta, após subir, para cima, pela escada, da laje, desci, para baixo, pela escada, para o chão. Portanto, subi para cima e desci para baixo.

- Ô, João, você não...

- Cale a boca. Eu ainda não terminei. Ao subir, para cima, pela escada, da laje, eu subi, portanto, para cima, e me pus, então, embaixo do telhado. Eu, portanto, subi, pela escada, do chão, para baixo do telhado. Posso, então, dizer que subi para baixo, neste caso, de cima do chão para baixo do telhado. Entendeu? Eu, depois, ao descer, pela escada, para baixo, da laje para o chão, me pus em cima do chão. Eu, portanto, desci, pela escada, de cima da laje (ou de debaixo do telhado, tanto faz) para cima do chão. Posso, então, dizer que desci para cima, neste caso, de cima da laje (ou de debaixo do telhado) para cima do chão.

- Mas, João, você não entendeu...

- Nem mas, nem meio mais. Vá estudar Língua Portuguesa e lógica básica, e não me torre mais a paciência.


*

Aula de interpretação de texto


Na sala-de-aula.

O professor:

- Vamos analisar, garotada, esta frase que escrevi na lousa. Vejam. Interpretação de texto. Leiam a frase. Aqui está assim "Na Igreja, casaram-se João e Maria." O que se quer dizer com tal frase? Quem sabe?

- Que o João casou com a Maria - disse Carlinho.

- Errado - disse o professor.

- Que a Maria casou com o João - disse Marcinha.

- Errado - disse o professor.

- Que o João ama a Maria e que a Maria ama o João - disse Robertinho.

- Errado - disse o professor. - Vamos, gente. Quem sabe? O que se quer dizer com esta frase "Na Igreja, casaram-se João e Maria."?

- Que na Igreja há um padre - disse Lucinha.

- Errado - disse o professor.

- Que tem bolo de chocolate na festa - disse Paulinho.

- Errado - disse o professor.

- Que o João e a Maria querem ter filhos - disse Vicentinho.

- Errado - disse o professor. - Vamos lá, gente. É aula de interpretação de texto.

- Que João e Maria viverão felizes para sempre - disse Andreiazinha.

- Errado - disse o professor.

- Que o João e a Maria eram solteiros antes de se casarem - disse Marquinhos.

- Não. Não. Não. E não. - disse o professor, meio desanimado.

- Que o padre é homem - disse Martinha.

- Na na ni na não - disse o professor. - Hoje vocês estão muito fraquinhos. Vou explicar o que se quer dizer com tal frase. Atenção. Vivemos... Prestem atenção. Vivemos numa social opressora, e nesta sociedade, que é patriarcal, os homens oprimem as mulheres. Sociedade patriarcal que dizer que a sociedade tem um patriarca, que é homem. Os homens oprimem as mulheres. João, então, oprime a Maria, porque o João é homem e a Maria é mulher. Temos que mudar isso, temos de acabar com o patriarcalismo, que é o governo dos patriarcas, que são homens, que são opressores, que oprimem os oprimidos, e os oprimidos pelos homens são as mulheres. E para acabar com o patriarcado temos acabar com a Igreja, que sustenta o governo patriarcal, que é opressor.

- Nada disso 'tá escrito na frase "Na Igreja, casaram-se João e Maria." - observou Beatrizinha.

- Eu sei - disse o professor. - Não 'tá escrito, mas 'tá implícito. Daí a importância da interpretação de texto. É importante saber interpretar texto.

- Mas o João casou com a Maria porque ele a ama e a Maria casou com ele porque ela o ama - disse Renatinho.

- Errado - disse o professor.

- É assim que eu interpreto o texto - disse Renatinho.

- Interpretação errada - disse o professor. - Você está ideologizado. Você está oprimido pelo seu pai, que oprime sua mãe, e ambos oprimem você, que é de uma família patriarcal. E seu pai e sua mãe casaram-se numa igreja, que sustenta o patriarcalismo.

- Meu pai e minha mãe casaram-se na Igreja. E meu pai ama minha mãe, que ama meu pai. E eu tenho três irmãos. Sou o caçula. Meu pai e minha mãe estão casados há vinte e seis anos. Já têm bodas de prata - disse Ricardinho.

- Eles não se amam - corrigiu-o o professor.

- Amam-se, sim - retrucou Ricardinho. - Eles me dizem...

- Eles não se amam - replicou o professor, perdendo a compostura. - Eles fingem que se amam. São de uma família tradicional. Eu, que sou professor, tenho preparo para entender o que se passa na sua família; você, não. E eu sei interpretar texto.

- Professor, você disse, na outra aula, que cada pessoa pode interpretar o texto de um jeito e que não existe a interpretação certa, e agora... - comentou Lurdinha.

- Eu sou o professor - interrompeu-a o professor. - Eu sei qual interpretação é a correta: a minha. Eu tenho preparo. Quantos anos eu fui à faculdade estudar o assunto? Muitos. E vocês? Nenhum.

- Mas... - disse Ricardinho.

- Não me questione. Aceitem o que eu disse. Agora, atenção, outra frase. Prestem atenção. Interpretação de texto. Numa empresa, à parede, uma folha de cartolina com a frase "Contratam-se funcionários." O que se quer dizer com tal frase?


- Que a empresa está contrando funcionários - disse Marquinhos.

- Errado - disse o professor.

- Que a empresa precisa de funcionários - disse Vicentinho.

- Errado - disse o professor.

- Que a empresa quer vender as coisas que tem, mas tem poucos funcionários para vendê-las - disse Renatinho.

- Errado - disse o professor. - Vamos, gente. Interpretação de texto.

- Que a empresa quer vender bolo de chocolate - disse Paulinho.

- Errado - disse o professor.

- Que a empresa vai pagar salário para as pessoas que ela contratar - disse Vanessinha.

- Errado - disse o professor. - Errado. Errado. Nada do que vocês disseram está certo. Vocês têm de aprender a interpretar textos. A interpretação correta da frase é: a empresa, uma instituição capitalista, é opressora, oprime os trabalhadores, que são pelos capitalistas oprimidos...


quinta-feira, 11 de novembro de 2021

Três

 Bozonaro, o malvadão. O vírus tem inteligência artificial. Notas breves.



Em 2020 e 2021 um vírus super-mega-hiper mortal ataca a Terra, e mata milhões de pessoas, em todos os países, menos no Brasil, onde as mortes atribuídas ao vírus foram causadas pelo presidente Bozonaro. E não contente com a mortandade, destruiu o vírus a economia de todos os países, menos a do Brasil, que foi destruída pelo Bozonaro.

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O vírus, que defende agenda política de esquerda, livrou a cara dos heróis dos esquerdistas, Macron, Fernandez, Trudeau e Merkel. Na França, na Argentina, no Canadá e na Alemanha, ele faz e acontece, e assume as responsabilidades pelos seus atos inconsequentes; já no Brasil - e nos Estados Unidos durante o governo Trump -, ele se faz de joão-sem-braço.

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O vírus hiper mortal está nas ruas, matando muita gente. Para impedi-lo de matar gente à beça devem as pessoas que executam atividades ditas não-essenciais viverem – se puderem - trancadas em suas casas até a chegada da vacina, poção mágica que dará fim ao vírus. Enquanto isso, as pessoas que executam atividades ditas essenciais podem executá-las livremente, respeitando, obviamente, protocolos sanitários. Ora, se o vírus está nas ruas, então as pessoas que executam atividades ditas essenciais, saídas à rua, foram irresponsáveis, pois, expondo-se ao vírus, arriscaram-se a serem por ele infectadas, e muitas o foram, de fato, e muitas das infectadas, assintomáticas, não vindo a saber que carregavam consigo o vírus, o transmitiram (caso proceda o discurso que ensina que as pessoas assintomáticas transmitem o vírus) para outras pessoas. Podem tais pessoas alegarem que seguiram protocolos sanitários; ora, se seguindo os protocolos sanitários, puderam exercer atividades fora de suas casas, por que as pessoas que exercem as ditas atividades não-essenciais não puderam exercer as suas, desde que também respeitassem os protocolos sanitários, os mesmos que as pessoas que executam as ditas atividades essenciais respeitaram? Será que o vírus só ataca pessoas que executam atividades ditas não-essenciais?

Eu ouvi muita gente - não poucas profissionais das áreas ditas essenciais - condenar as pessoas que, de áreas profissionais ditas não-essenciais foram irresponsáveis ao se recusarem a respeitar a quarentena, retirarem-se de suas casas e irem às ruas. Ora, o vírus ataca as pessoas que, consideradas de profissões ditas não-essenciais, saem às ruas, mas não as que saíram à rua para o exercício de suas atividades ditas essenciais? O vírus sabe distinguir as duas categorias de pessoas, as profissionais de atividades ditas essenciais das profissionais de atividades ditas não-essenciais? Tem o vírus inteligência artificial, com certeza.

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Um filme e um livro

 Ilya Muromets (1956) - direção: Alexander Ptushko


Baseia-se em um conto do folclore russo, de autoria dr M. Kochnev, a estória deste filme, que não tem muitos atrativos. É o seu herói Ilya Muromets (Boris Andreyev), homem de talentos sobre-humanos; a sua força é descomunal; sua valentia, irrivalizada. Está ele, em seu lar, na aldeia Karacharovo, quando guerreiros das estepes, sob o comando do tzar Kalin, (Shukur Burhonov) atacam-la, reduzem às cinzas muitas de suas habitações, e raptam Vassilisa (N. Myshkova). Na sequência, visitam a aldeia arruinada peregrinos que haviam recebido, do espírito do cavaleiro Svyatogor, herói lendário, mítico, uma espada, que eles deveriam entregar ao homem que estava destinado a salvar a mãe Rússia. E Ilya Muromets era tal herói. Ele nada pudera fazer para salvar Karacharovo da selvageria dos invasores porque não tinha os movimentos de seu corpo, os que recuperou assim que bebera um líquido, cujo principal ingrediente era certa erva de propriedades curativas, que os peregrinhos lhe haviam oferecido. Tão logo viram que Ilya Muromets reapropriara-se de sua força, entregaram-lhe os peregrinos a espada que em tempos imemoriais pertencia a Svyatogor. E o herói russo, destinado a salvar a sua pátria, após encontrar seus pais, e pedir-lhes a benção para ir a Kiev - que os guerreiros das estepes pretendiam conquistar -, e deles recebê-la, montou em Burushka, um potro, que o acompanharia em toda a longa viagem, durante cujo transcurso ele cresce, amadurece, encorpa-se, até assumir as formas de um robusto e formoso cavalo preto. E ao chegar Ilya Muromets em uma encruzilhada, corvos apresentam-lhe três caminhos: o que o levaria à riqueza; o que o conduziria ao seu casamento; e o que o condenaria à morte. E o herói decide seguir o que lhe daria um fim trágico. Era um herói Ilya Muromets. Para salvar Kiev, recusou a fortuna e as delícias do casamento. Estava decidido a sacrificar-se numa aventura que lhe exigiria coragem, sabedoria e força de vontade para enfrentar, e superar, todos os obstáculos que encontraria em seu caminho. E seguindo o herói seu curso, depara-se com o pequeno Rouxinol, o Ladrão, um ser disforme, repulsivo, cujo sopro provocava ventanias devastadoras. E o derrota. E segue rumo às terras do príncipe Vladimir (A. Abrikosov) e da princesa Apraksya (N. Medvedeva), onde conhece Dobrynia (G. Dyomin), um herói russo, e outras personagens lendárias. E resgata Vassilisa. E contratempos o fazem ser punido pelo príncipe Vladimir, que manda que o encarcerem num calabouço lúgubre, onde, aprisionado por anos, não morre de fome e sede porque uma toalha de mesa, mágica, que lhe tecera Vassilisa, dá-lhe o alimento e a água de que necessitou durante os anos de cárcerr. E revela-se Mishatychka (S. Martinson), súdito do príncipe Vladimir, traidor, a agir em favor do tsar Kalin. E encaminha a aventura para o seu fim. Ilya Muromets e seu filho digladiam-se, em Kiev, tsar Kalin e oe seus guerreiros a atacarem-la. É sangrenta a batalha. Ao final, aparece de entre as montanhas um dragão de três cabeças.


É o filme aventura, musical, comédia, drama, épico, romance histórico. Contêm em sua fórmula ingredientes destes gêneros e de mais alguns outros. Um dos seus atrativos é a paisagem, vasta, exibida em cenas panorâmicas; outro, o humor, simples, ingênuo - em algumas cenas, involuntário. Tem o filme duas cenas engraçadas, que saltam aos olhos, a graça produzida por erros de produção. Uma se dá num campo, após uma batalha, cadáveres a cobri-lo: um dos cadáveres, supostamente morto, move o braço esquerdo, para, assim me pareceu, remover da testa alguma coisa que o incomodava. Cá entre nós, o cadáver não estava inteiramente morto; não era um autêntico defunto. A outra cena, também em um campo de batalha: um soldado russo a manejar a espada com tal displicência que fiquei com a impressão que o ator que o representava não tinha a mínima idéia do que estava fazendo.

Sei que é o filme antigo, velho de sessenta e cinco anos, e que os recursos cinematográficos do ano de sua produção - e os soviéticos não nadavam, ao contrário do que afirmava a propaganda comunista, em dinheiro - não chegavam aos pés dos atuais, mas os produtores bem que podiam ter caprichado um pouco mais na construção do dragão de três cabeças que dá o ar da sua graça nas cenas finais do filme; parece tal monstro um boneco gigante de carro alegórico de escola de samba brasileiro.

É Ilya Muromets, de Alexander Ptushko, apesar de todos os seus defeitos, que são muitos, e eu decidi mencionar apenas alguns deles, um bom entretenimento.


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A Mulher que Fugiu de Sodoma - de José Geraldo Vieira


Poucos livros agarraram-me pelo pescoço, e soltaram-me só depois de eu ler-lhe a última de suas palavras. A Mulher que Fugiu de Sodoma é um deles. Está vazado num estilo simultaneamente simples e sofisticado, de bom gosto literário. É uma narrativa cativante, o autor a retratar o seu herói com sensibilidade rara, incomum, dedicando-lhe amor e carinho paternais, severo e ao mesmo tempo meigo, a cuidar dele com desvelo, porque sabe - afinal, é-lhe o criador - que ele irá se perder, e sua onisciência fá-lo disposto a compreendê-lo, respeitá-lo, amá-lo.

Narra José Geraldo Vieira a queda do médico Mário Montemor, que se vê em apuros devido ao seu vício em jogos (de azar, para muitos; de sorte, para poucos, os escolhidos; de muita, muita sorte, para os donos da banca). Faltando à lealdade ao doutor Silva Soares, vem Mário Montemor a lhe dever uma soma impagável. Após inteirar sua esposa, Lúcia Montemor, da situação em que se pusera, ela, dedicada, sai em busca do dinheiro correspondente ao valor da dívida que ele contraíra, e teria de arrumá-lo até a data aprazada pelo credor. Recorre Lúcia Montemor à Natália Cordeiro, sua prestimosa e solícita amiga, e à sua tia Marta, que lhe dedica amor inexcedível, e, enfim, à Ana Maria, sua amiga, esposa de Nuno de Almada, empresário miliardário, magnata brasileiro, cuja riqueza se rivaliza com a dos potentados europeus. Bem-sucedida em sua empresa, livra seu marido do apuro em que ele se pusera, mas ele não se emenda. A morte do "Segundo Clichê", menino que vendia jornais, filho de Justiniano, foi, entende Lúcia Montemor, consequência do descaso, da irresponsabilidade de Mário, de quem ela se afasta. Lúcia Montemor recorre à tia Marta, que a acolhe. Ana Maria pede à Lúcia que ela lhe seja preceptora da filha, Leonor, e ela não se faz de rogada e transfere-se para a casa dos Almada. Neste meio tempo, Mário Montemor, após vender alguns de seus pertences, e com o dinheiro da venda saldar algumas dúvidas de jogo, recorre ao seu tio Zózimo, que o repreende, exorta-o a ir à Europa estudar medicina e se compromete a sustentá-lo durante os anos de estudos. Mário aceita-lhe a oferta, e embarca para a Europa, e instala-se em Paris. No início, ele se dedica aos estudos, aprimora os seus conhecimentos; e diverte-se com a modelo Pervanche, de quem se torna amante. Mas não persiste nos estudos; logo perde-se, o jogo o excita; aposta boa soma em corridas de cavalos; contrai dívidas. E morre-lhe o tio Zózimo, que lhe enviava, mensalmente, dinheiro para o sustento. Endividado, sem rumo, reduzido, devido o seu vício do jogo, à miséria, envolve-se com criminosos; encontra moradia na rua. Adoece. Amigos o acolhem, ajudam-lo, dele cuidam. E o que lhe sucede o leitor saberá ao ler o livro.

O leitor percebeu que eu falei de Mário Montemor, mais dele do que de qualquer outro personagem, e concluiu que é ele o herói do drama que nos conta José Geraldo Vieira, e pergunta-se porque é o título do livro A Mulher que Fugiu de Sodoma. É Lúcia Montemor, esposa de Mário Montemor, a personagem que, ausente da maioria dos episódios do romance, está presente em toda a obra, da primeira à última linha, em todos os episódios, pois é a figura dela que Mário Montemor tem em seus pensamentos; ela está nos sonhos dele, nos pensamentos dele; ele a tem consigo todo o tempo. É Lúcia Montemor a personagem central do romance, seu coração, sua alma. Mulher dedicada ao marido, de alma pura, ela recusa a Sodoma que o mundo lhe oferecia, oferta que lhe redundaria, se ela a aceitasse, na perdição da alma. A cena derradeira da sua aventura ilustra a sua rejeição à Sodoma.

É o livro de José Geraldo Vieira, A Mulher que Fugiu de Sodoma, uma obra magnífica, uma obra-prima da literatura brasileira. De leitura agradável. De estilo primoroso. Anima-a personagens cativantes. Em poucas horas de leitura, segui Mário Montemor em suas desventuras dramáticas, narradas com esmero, e simpatizei-me com ele.

Apenas os mestres da literatura conhecem a fórmula mágica da criação de personagens humanos, autenticamente humanos. E José Geraldo Vieira é um deles.




domingo, 7 de novembro de 2021

Três

 Ração boa pra cachorro


Dirigiu-se Antonio Roberto, às dez horas da manhã, à loja de vendas de artigos para animais; assim que lá chegou, atendeu-o uma funcionária, moça de uns vinte anos, baixa, de, se muito, um metro e sessenta de altura, esbelta, que então ajeitava, com uma maria-chiquinha, os cabelos pretos, lisos, volumosos. Sorridente, ela saudou-o, exibindo-lhe sua fileira de dentes brancos: "Bom dia, senhor. O que o senhor deseja?" E Antonio Roberto respondeu: "Ração para um cachorro velho, de dentes bem fracos." "Cachorro pequeno, ou grande?" "Médio. Um vira-lata. Ele tem, acho, uns quinze quilos." "Temos estas duas rações." - e mostrou-lhe os dois pacotes. "São boas para cachorros velhos de dentes fracos?", perguntou-lhe Antonio Roberto. "Sim, senhor. São macios. Veja." - e apertou a moça dois pacotes, um de cada tipo de ração que indicara a Antonio Roberto, sentindo a ração entre os dedos. E Antonio Roberto repetiu-lhe o gesto. "É verdade. São macios, bem macios. Vendem à granel?" "Sim, senhor. De quanto o senhor precisa?" "Das duas rações, meio quilo de cada. Darei das duas para o meu velho amigo, e verei qual delas ele come, qual não." "É melhor, né? Assim não desperdiça ração." E a moça pesou meio quilo de cada uma das duas rações escolhidas, e entregou a Antonio Roberto um pequeno pedaço de papel com o logotipo da empresa, no qual escrevera o preço a pagar pelas rações, e disse-lhe que pagasse no caixa e retirasse a compra no balcão. E ele seguiu-lhe as orientações. Aproximava-se Antonio Roberto do balcão, quando a moça que o atendera afastou-se para falar com outra funcionária; e chegou-se ao balcão um funcionário, que, vendo a sacola com as rações empacotadas, perguntou para Antonio Roberto: "Esta ração é para o senhor?", e ele lhe respondeu: "Para mim, não; é para o meu cachorro." O funcionário riu, a moça riu e pegou a sacola e entregou-a a Antonio Roberto, e agradeceu-lhe a visita à loja no mesmo instante em que ele, rindo, dizia: "Esta ração é boa pra cachorro."


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Dois vídeos de Rodrigo Gurgel, crítico literário. Semana de 22 e os medalhões da Literatura.


Assisti, ontem, 04/08/2021, no Youtube, a dois vídeos, ambos de um pouco mais de três minutos de duração, do professor de Literatura e crítico literário, Rodrigo Gurgel. São os dois vídeos, um publicado no dia 17/03/2020, e o outro no dia 29/02/2020, respectivamente, "A Desnecessária Semana de 22" e "Devemos Dissecar a Literatura Sem Ter Receio dos Medalhões". Ambos os dois vídeos completam-se. No segundo aqui mencionado, diz o professor que não é papel do crítico literário demolir a reputação dos escritores, reduzir à pó as suas obras, mas dialogar com eles, e avaliá-las em seus aspectos positivos e negativos. Menciona o poeta brasileiro Manuel Bandeira, e diz que ele, prosador e poeta de recursos literários inesgotáveis, um escritor de mão cheia, fora de série, escreveu, para honrar seus compromissos, sob encomenda, peças constrangedoramente medíocres, que, é óbvio, não incorrem em diminuição do valor de sua obra, e tampouco lhe desmerece o talento. E aqui tece críticas aos modernistas da Semana de 22, citando-a por alto. E a literatura da Semana de 22 é o tema central do primeiro vídeo mencionado linhas acima. Neste vídeo, dedica atenção a Menotti del Picchia, e usa-o para ilustrar a sua tese. Dez anos após a Semana de Arte Moderna, de 1922, escreve Menotti del Picchia livro de qualidade superior aos que ele escreveu sob influência dos modernistas: Kummunká, obra de cunho filosófico e social. E além de Menotti del Picchia, outros autores modernistas, à margem do movimento modernista, escreveram obras valiosas, que em muito superam as que escreveram submissos, num ímpeto revolucionário, iconoclasta, elitista, sob os ditames da escola modernista. E entende o crítico literário desnecessária a Semana de 22 porque tinha o Brasil, então, uma literatura que emulava à dos europeus, literatura que contava, entre seus principais expoentes, com Machado de Assis, Euclides da Cunha e Monteiro Lobato - e estes dois últimos experimentaram estilos retóricos mais fiéis ao ambiente cultural brasileiro. E dois importantes escritores regionalistas, Graciliano Ramos e Rachel de Queirós torciam o nariz para os modernistas.

Diz o professor Rodrigo Gurgel que têm os brasileiros de entabularem palestra amigável com os escritores brasileiros, e com os medalhões, sem temê-los, e tê-los como interlocutores; e dentre tais medalhões estão os escritores modernistas, que, muitos entendem, têm de ser pelo povo reverenciados, cultuados, e não estudados, avaliados. Lição proveitosa dá aos brasileiros o professor de Literatura e crítico literário Rodrigo Gurgel.


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Ragnarok (Ragnarok - 2013) - direção: Mikkel Brænne Sandemoso


O arqueólogo Sigurd Svendsen (Pål Sverre Hagen), nostálgico de uma era que ele não viveu, a de remotos antepassados vikings, após decifrar uma antiga inscrição, em pedra, nórdica, que seu amigo Allan (Nicolai Cleve Broch) encontrara e entregara-lhe, segue, o amigo Allan a secundá-lo, e acompanhado do filho Brage (Julian Podolski) e da filha Ragnhild (Maria Annette Tanderø Berglyd), e de Elisabeth (Sofia Margareta Götschenhjelm Helin) e de Leif (Bjørn Sundquist), até o Olho de Odin, uma ilha isolada, no norte da Noruega, numa região distante da civilização. Descobrem os aventureiros que na Segunda Guerra Mundial os soviéticos haviam chegado àquela ilha e às suas vizinhanças, regiões inóspitas, praticamente inacessíveis, que havia muito tempo não via humanos. Desde que se embrenharam pela densa floresta, surpreenderam-los fenômenos misteriosos. São muitos os veículos soviéticos abandonados, corroídos pelo tempo e pelas intempéries. E encontraram Sigurd e os que o acompanhavam um bunker abandonado às aranhas. A presença de tal prédio suscitou-lhes a curiosidade, que foi-lhes estimulada pela presença, numa caverna, que eles adentraram, de esqueletos humanos e armaduras antigas, de mil anos antes, dos vikings. Qual havia sido a causa da morte das pessoas cujos esqueletos eles encotraram? Qual criatura se manifesta durante o Ragnarok? E ao depararem-se com uma criatura colossal, lendária, sentiram-se obrigados a abandonarem a ilha e irem-se embora, e imediatamente.

É Ragnarok uma aventura despretensiosa, com ingredientes comuns em número sem conta de filmes do gênero. Há mistério, que não é muito misterioso, tensão, que não é tensa, não excita os nervos, obrigando o expectador a suspender a respiração, e personagens que se encontram em onze de cada dez filmes do gênero: o pai viúvo; a filha adolescente rebelde; o amigo traiçoeiro; o ajudante inescrupuloso; a mulher que se apaixona pelo herói, que por ela se apaixona; o monstro; o filho do monstro. E a aventura se passa numa região distante da civilização, misteriosa, a guardar segredos milenares. Tem o filme algumas mortes e um pouco de emoção. E só. É Ragnarok um passatempo apenas.

sábado, 6 de novembro de 2021

Histeria

 Comedores de ossos. Covas e mais covas. Setecentos cadáveres. Pilhas de mortos. Histeria.


Publica-se uma foto de um homem recolhendo, não se sabe onde, ossos, acompanhada da informação "dezenove milhões de pessoas passam fome no Brasil", e tal imagem e a idéia nela e no texto embutida, a de que a fome é consequência das ações do presidente Jair Messias Bolsonaro, viralizam, como se diz em tempos de internet. E as pessoas vêem na foto dezenove milhões de esfomeados a chafurdarem-se em lixões e depósitos de lixo de açougues à procura de carne. Tal me faz lembrar três notícias, e a repercussão delas entre as pessoas caídas em histeria, do ano passado. Em uma delas, uma foto a mostrar um comboio militar na Itália acompanhada do texto "setecentos mortos em um dia". As pessoas além de na foto verem caminhões militares, carros e algumas pessoas à pé, viram, excitadas pela imaginação corrompida pela histeria, os setecentos cadáveres indicados no texto que acompanha a foto. Em outra notícia, exibia-se, do alto, bem alto, a partir de um helicóptero, imagens de um cemitério, localizado na cidade de São Paulo, milhares de covas abertas, imagens acompanhadas de uma informação: eram milhares os mortos por covid que a prefeitura tinha de abrir muitas covas para enterrar todos os cadáveres. E as pessoas, ao verem as covas abertas, vazias, abaladas pelo bombardeio de notícias dramáticas, trágicas, que anunciam o apocalipse, as viram habitadas cada uma delas - e elas eram milhares - por um defunto produzido pelo coronavírus. Na terceira notícia, uma foto com vários caixões empilhados acompanhada da informação de que eram tantas e tantas as vítimas do vírus que as empresas estavam produzindo caixões como jamais se viu. E as pessoas, ao olharem para a foto com as pilhas de caixões viram dentro deles as vítimas do covid.

E assim o mundo gira.

Nota: Não me recordo dos detalhes, que são irrelevantes neste texto, de tais notícias. 

Política

 Acabou a mamata. A velha e a nova política. Comparações históricas. E outras notas breves.


Anti-bolsonaristas dão notícia - não vem ao caso, aqui, se procedem, ou não - de que membros do Governo Federal fizeram uso particular de recursos públicos e destacam, indignados: "Acabou a mamata?", querendo com tal interrogação dizer que o presidente Jair Messias Bolsonaro conserva os vícios, já lendários, folclóricos, de uma cultura milenar, dos homens públicos brasileiros. Ora, tais pessoas, tão indignadas com o descaso com o dinheiro público pelo atual chefe da nação, ao perguntarem se a mamata acabou, indicando com tal pergunta que é o uso do dinheiro público destinado para uso particular hábito antigo no Brasil, reconhecem que tal prática já existia antes de Jair Messias Bolsonaro assumir a presidência. Pergunto-me, então, porque não se indignavam com tal cultura política nacional dos antecessores do presidente e com a de outros políticos e porque elogiam muitos deles.


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Não há velha política, tampouco nova política. Há política. Mas para se diferenciarem da política, a velha, associada à corrupção, insistem alguns políticos em dizem que fazem uma política nova, que da velha se distingue. Aí eu leio e escuto gente declarando que o presidente Jair Messias Bolsonaro faz a nova política e é tal qual os políticos da velha política e defendendo políticos da velha política, sem perceber que estão defendendo a velha política.


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Após o dia 7 de Setembro de 2.021, alguns intelectuais da direita conservadora revolucionária que ambiciona pôr no chão o tal estamento burocrático, desiludidos, frustrados, ao verem que o presidente Jair Messias Bolsonaro não lhes realizou o sonho tão acalentado, numa postura à criatura de cabelos multicoloridos imitadora de foca, comparam-lo com Dom Pedro I e Winston Churchill e, usando de imaginação pobre, reescrevem a história, emprestando-lhe um ar ficcional, destes dois nobres personagens da História, substituindo-os, em momentos emblemáticos da História Universal, o primeiro, no Grito da Independência, o segundo, na ação contra Hitler, por Jair Messias Bolsonaro, este a prosternar-se, pusilânime, às margens do Ipiranga, diante da Coroa Portuguesa, e, de cabeça abaixada, acovardado, a exercer no cenário mundial, uma política de apaziguamento com o Terceiro Reich. Tais intelectuais usam de uma demão de cultura para ocultar do público a mentalidade mesquinha e a má-vontade que os movem.


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Há anti-petistas... corrijo-me: havia anti-petistas... Melhor: certas pessoas, que se diziam anti-petistas, por conveniência, ou por sentimento sincero, afirmavam, antes de Jair Messias Bolsonaro assumir a presidência do Brasil, no dia 1 de Janeiro de 2019, que o PT havia destruído a Educação no Brasil; que o PT havia feito da Cultura brasileira uma imundície; que os petistas eram corruptos, os seres mais corruptos da face da Terra; que os petistas eram vagabundos; que o PT estava destruíndo o Brasil; que o PT, enfim, era o que havia de pior no universo. Mas bastou Jair Messias Bolsonaro assumir a presidência, que no dia 2 de Janeiro de 2019, limparam a imagem do PT, agora modelo de partido democrático, que sabe dialogar com os seus antigos - agora ex - oponentes na arena política, o PSDB, e que foi o presidente Jair Messias Bolsonaro quem destruiu a Educação e a Cultura brasileiras; e que é ele o homem mais corrupto do universo, e coisa e tal.


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Recordo-me do dia em que o presidente Jair Messias Bolsonaro deu a público, em uma de suas contas de redes social, um vídeo que exibia dois marmanjos a performancizarem, é assim que dizem?, uma obra artística, o tal Golden Shower, que consiste em um dos marmanjos a mijar na cabeça do outro. De início os críticos do presidente descarregaram contra ele uma catadupa de impropérios, alcunhando-o estúpido e grosseiro por exibir coisa tão degradante, tão repulsiva, tão imoral, mas tão logo elevaram-se as vozes dos, como se diz?, vanguardistas, especialistas em arte moderna, passaram a condená-lo por exibir uma obra de arte indicando-a como se uma imundície fosse e o alcunharam estúpido e grosseiro porque ele nada entende de arte. Além dos anti-bolsonaristas que ocupam cadeiras nas empresas de comunicação fazerem papel tão vergonhoso; além da manifestação pública de estudiosos que entendem ser arte um... um... não sei o que; além da ousadia desavergonhada de pessoas que se exibem desinibidamente, a expôr, em locais públicos de grande aglomeração de pessoas, as suas, assim dizia-se em tempos imemoriais, vergonhas, houve aqueles, anti-bolsonaristas, que declaram, indignados, que o presidente Jair Messias Bolsonaro havia incorrido num ato, ao exibir o vídeo, inconsequente, irresponsável, que prejudicava a imagem do Brasil no exterior, mas nenhuma censura fizeram às pessoas que promoveram espetáculo tão grotesco, e não se perguntaram há quantos anos tal coisa se exibe no Brasil e por que as autoridades públicas jamais se manifestaram publicamente a respeito.

Além das palavras que vão expostas no primeiro parágrafo, tenho de registrar: se se considera arte o Golden Shower, então o Golden Shower, uma arte, pode ser ensinada, nas escolas, pelos professores de arte, nas aulas de arte; e se um pai de um aluno, ao saber que seu filho está exposto a tal arte, ir tirar satisfações com o professor, ele, o pai, será escrachado, ridicularizado, apodado ignorante e estúpido e condenado à prisão perpétua.

O presidente Jair Messias Bolsonaro, com a exibição de tal vídeo, fez um imenso bem aos brasileiros: expõe a podridão da intelectualidade e dos profissionais da imprensa, e da classe artística, e de uma parcela da sociedade brasileira, corrompida pela intelectualidade e pela imprensa.


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Os isentões são de uma parcialidade explícita, embora digam o contrário. Nas críticas ao presidente Jair Messias Bolsonaro eles as dedicam a ele, exclusivamente a ele, e nas críticas ao ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva (ou ao PT) nelas incluem o presidente Jair Messias Bolsonaro e, salientam, dizem não serem a favor nem de um nem do outro.

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Notas breves

 Café, sim; Coca-Cola, não. Foi-se o Aquecimento Global. Pelé. Dinossauros e pernilongos. E outras notas breves.


Café, sim; Coca-Cola, não.

Um historiador brasileiro de primeira grandeza chama-nos a atenção para uma atitude, inusitada de tão grosseira e estúpida, do presidente do Brasil, o senhor Jair Messias Bolsonaro: o distinto chefe-de-estado nacional recusou a oferta que lhe fizeram de beber algumas doses de café, produto genuinamente nacional, e optou por beber um refrigerante genuinamente estadunidense, a Coca-Cola. Lastimável, a conduta desdenhosa do presidente da maior nação da América do Sul. Lastimável! É mais um exemplo da mentalidade nazista, fascista, genocida, machista, racista, supremacista branco do presidente Jair Messias Bolsonaro, um homem deplorável. Impítima! Que ele seja julgado, e condenado, por crimes contra a humanidade e a Terra, no Tribunal de Haia!


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Foi-se o aquecimento global. O monstro, agora, é outro.


Exterminaram os ambientalistas o Aquecimento Global. Ameaça-nos, agora, a Mudanças Climáticas; e para dar-lhe fim os ambientalistas querem reduzir a emissão do CO2, que lhe serve de alimento e fortalece, obrigatoriamente, o extino Aquecimento Global. Não entendi patavinas, nem bulhufas, do imbróglio. Afinal, exterminaram, ou não, o Aquecimento Global, anunciador do apocalipse?! Ou é a Mudanças Climáticas avatar feminino do Aquecimento Global?! ou o Aquecimento Global reencarnado numa entidade feminina?! Neste mundo de "cancelamentos" até os fenômenos naturais apocalípticos masculinos são assassinados para que assumam o protagonismo da história seus correspondentes femininos, sempre superiores, mais poderosos. Que mundo infernal!


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Reza a lenda que Pelé, o nosso querido Edson Arantes do Nascimento, é canhoto. Ora, se é verdade que é ele canhoto, então o jornalista cuja reportagem, publicada ontem, li hoje, mentiu ao dá-lo como um futebolista destro no manejo da bola. Afinal, é Pelé canhoto, ou destro? Ou ambidestro?


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... e um dinossauro caiu, no México - e tenha de ser no México!? Não podia ser na Argentina?! -, em uma era em que mexicanos e brasileiros ainda não haviam erguido um muro na fronteira entre México e Brasil, e dizimou os dinossauros. Que meteoro inconsequente! Por que ele não exterminou os pernilongos? À noite, eu, deitado na cama e os menestréis de pernas longas a atanazarem-me e a atazanarem-me com as suas melodiosas canções e trovas campestres. E eu, sem pregar o olho, a atravessar, em branco, ou em claro, tanto faz, a noite. Fossem os pernilongos varridos para outro plano existencial, e não os dinossauros, hoje admiraríamos estes monstrengos a perambularem modorrentamente pela vastidão dos continentes, e poderíamos dormir tranquilos e sonhar com os anjos.


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Os carinhas apoiaram, incondicionalmente, a política do Fique Em Casa e afirmaram ser tal política indispensável para se combater a disseminação do coronavírus. Depois de meses, a crise econômica batendo na porta, os preços de alimentos e combustíveis a elevarem-se consideravelmente, além de não verem uma relação de causa e efeito entre a política que defenderam com unhas e dentes e a crise econômica, culpam o presidente Jair Messias Bolsonaro pela crise econômica, sendo que ele não promoveu o Fique Em Casa, e esquecem-se que as medidas de restrições às atividades econômicas foram decretadas tendo-se em mente a redução dos casos de mortes, durante a epidemia, pelo vírus. Ora, para tais pessoas foram essenciais tais medidas, e a crise destas advinda foi por elas prevista, afinal, elas esgoelavam em tom autoritário "Fique Em Casa; a economia a gente vê depois.", cientes de que o impacto na economia da política insana (que elas consideravam sensata) que defenderam seria devastador; se não, por que o "a economia a gente vê depois."?

Mas entendo que a percepção que os anti-bolsonaristas tem da economia nacional está distante da realidade, talvez num universo paralelo. A economia brasileira enfrenta alguns percalços, é inegável, mas não vai de mal a pior, como dizem por aí os anti-bolsonaristas, que empreendem uma aventura política de terra arrasada e querem fazer as pessoas verem o que não existe. Se a economia nacional não vai de vento em popa, e não vai - e não podemos desconsiderar as adversidades que o mundo enfrentou nestes últimos vinte e quatro meses -, também não está indo à bancarrota; acredito, mesmo, que cresce, e agora alicerçada em bases mais sólidas.


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Intelectuais da direita conservadora querem que o presidente Jair Messias Bolsonaro jogue por terra o tal de estamento burocrático, este glutão paquidérmico, um primo distante do Gargântua, que está, há séculos, a devorar os brasileiros. De mentalidade revolucionária, românticos aguerridos, bravos e destemidos, heroicamente dispostos a sacrificarem sangue alheio, não dizem o que o presidente Jair Messias Bolsonaro teria de fazer após o desmantelamento do tal estamento burocrático, e tampouco o que os de tal estamento e seus aliados instalados aqui em terras brasileiras e os estabelecidos no exterior fariam se iriam reagir ao desmonte do edifício que lhes faz a fortuna, ou se se resignariam, prosternados, impotentes, diante do presidente Jair Messias Bolsonaro, que lhes tirara o osso da boca. Nesta hora, penso no Garrincha: "Combinaram com os russos?"

Com tais amigos, o presidente Jair Messias Bolsonaro não precisa de inimigos.

Dentre tais intelectuais, há os que declaram que de nada adianta o presidente Jair Messia Bolsonaro indicar fulano, ou beltrano, conservadores, para o STF, porque eles são produtos do estamento burocrático - ou sistema, ou mecanismo. E o que propõem tais criaturas? Que o presidente Jair Messias Bolsonaro destrua o estamento burocrático, e, depois, crie um novo STF, cujas onze cadeiras seriam ocupadas por ministros conservadores. Quanta sabedoria! E de onde sairiam tais ministros? Das escolas do novo estamento burocrático, agora conservador. E quando? Eis a questão. Quanto tempo é preciso para se erguer novo estamento burocrático, agora conservador? E até lá como fica a justiça no Brasil? Viverá os brasileiros sob um regime anárquico? Se é que se pode viver em tal regime. E os inimigos do Jair Messias Bolsonaro ficariam, de braços cruzados, a admirá-lo a reconstruir o Brasil como lhe desse na telha?


quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Dois

 Patrulheiros em Alerta (The Midnight Patrol - 1933) - com O Gordo e o Magro


A piada está no título. Alertas os dois patrulheiros mais bobos, tolos, patetas de que se tem notícia? Está aí a piada. E ao saber do título, esboça-se um sorriso no rosto de quem o lê, e já se anteve a sucessão de disparates que Stan Laurel e Oliver Hardy irão empreender com as suas proverbiais sabedoria e perspicácia, tão admiráveis, e invejáveis, que causam em todos espanto.

Estão os dois patrulheiros no interior de uma viatura policial, quando ouvem um comunicado, via telefone, da polícia: ladrões roubam o estepe da viatura policial. Ao ouvir tais palavras, quem assiste ao filme recusa-se a acreditar que os dois patrulheiros não haviam presenciado a ação dos criminosos. Resolvida - e do modo que o foi - o caso, recebem os patrulheiros outro comunicado da delegacia de polícia: em andamento uma invasão à certa residência. Conquanto atilados patrulheiros, Stan e Laurel esquecem-se do endereço em que um criminoso estava a cometer o crime. E Stan dirige-se a uma loja onde se depara com um arrombador de cofres, e com ele dedica alguns minutos de sua suspicaz atenção, mantêm com ele um diálogo, apropriado, pode-se dizer, considerando-se as circunstâncias, e, um telefone à mão, disca para a delegacia de polícia, e solicita ao seu interlocutor do outro lado da linha o endereço em que um criminoso perpetrava um crime. E anota os dados que ele lhe dá em uma folha de papel. E ele surpreendentemente atrapalha-se e perde as informações anotadas. E Oliver tem de realizar ligação telefônica à delegacia. E agora, de posse do endereço da residência que um criminoso escolhera para roubar, rumam os dois patrulheiros, de viatura policial, ao local do crime. Lá chegando, deparam-se com o criminoso com a mão na massa. As cenas que se seguem no interior da residência, até a captura do meliante e a condução dele à delegacia de polícia revelam a vocação de ambos os patruleiros para o correto exercício de homens da lei.


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Mensagem de Barnabé Varejeira - Halloween. Black Friday. Palavrões.


Bão dia, Cérjim. O sór tá um pôco desanimado ôje. Parece inté que tá desacorçoado. Percisa de um pôco de café-da-manhã bem reforçado pa te força pa inluminá o dia. Tá fraquinho, que só veno. À noite, choveu, e choveu, e choveu sem pará. Parecia inté um dinlúvio. Pará a chuva parô, mas só por um tiquinho ansim de tempo. Choveu pá dedéu. A terra tá moiada, encharcada. E parece que o sór não tá com vontade de dá as cara ôje, não. Vâmo vê se até antes de eu encerrá esta mensage ele se anima e taca fogo no mundo. Vâmo vê. Se não, ele só vai parecê de noite. Este é o dia de ôje cedo, bem cedo, então, vâmo trabaiá, faça sór, ô faça chuva. Mas, antes de i trabaiá, vô terminá de concluí está mensage. O cê que é um óme da cidade já deve tê ovido as pessoa falá uns palavrão que vem do estrangero. Se o cê fala os palavrão, eu não sei, e nem quero sabê; eu nunca ovi palavrão saí da sua boca. Eu às vez pregunto pa pessoa que fala comigo, quano ela fala os palavrão, se elas sabe falá língua de gente, e elas ri achano graça, achano que tô contano piada, e há quem dentre elas que emburra, fecha a cara, óia torto, óia pa mim como se oiásse pô tinhoso, os óio a chispar fogo dos inferno. Mas que diabo! Perdão, Menino Jesus! Perdão! Não presta falá ansim. Meu Deus do céu! Parece que as pessoa perdêro a qualidade de falá; passáro por uma mentamorfose, e viráro bicho. Veja o cê, Cérjim, o que ovi, transondonteonte, aí, em Piamoangaba. Tava eu passano perto da fêra, e ovi um jóve falano pá ôtro jóve: "No bléquefraude o meu fáder vai comprá pa mim um rômetíte por trinta ófi, maibróde." E o amigo dele disse pá ele, ansim: "Da hora. E o que cê vai fazê no raloín?" E adespois faláro mais arguns palavrão, mais o menos ansim: "O tal - e falô um nome não sei de quem, se de um primo, o de um tio -, agora trabaia de róme alface. Lôco. Não sai de casa pa trabaiá. Óquei, máifrendi! Beleza! O bagúio é lôco!" Não entendi o que eles disséro. E mais adiante, ovi uma bela moça, muito bonita, diga-se de passage, falá que a irmã dela foi no féchauique, e rélpi! rélpi! e istópi, istópi, e taime, um taime, e uíquende, o uiquente, não sei, e chópi, e otros palavrão que Deus me livre! E o cê não sabe o que ovi das conversa dos óme lá na praça, falano de computador e firme: rarduér, sofituér, espaidermem, áiromem, e ôtros palavrão que não falo, nem escrevo. Se aquelas gente falasse um indioma, tudo bem, afinar seria coisa nossa, a quar nos deixô os índio. Que tem arguma coisa errada, Cérjim, neste mundo, tem. Tão pondo comida estragada no prato das pessoa, não é possíve! Parece, Cérjim, que o sór tá se animano. Parece. Já esquentô um poquinho. Agora, vâmo trabaiá. Fique com Deus Nosso Senhor Jesus Cristo. Inté mais, Cérjim.


domingo, 31 de outubro de 2021

Dois filme e dois comentários

 Uma Hora da Madrugada (One A. M. - 1916) - de Charles Chaplin


Após uma carraspana homérica - presume-se, dado o estado de embriaguez do herói da comédia -, Charles Chaplin, pra lá de Bagdá, está num táxi daqueles bem antigos. Que seja antigo o táxi não surpreende, afinal é o filme do ano de 1916. Quer o ébrio retirar-se do veículo. Mas há jeito!? O carro não quer que de si saia seu passageiro. Talvez tal pensamento tenha preenchido a cabeça de Chaplin durante o seu embate com o monstro de metal, que o havia devorado. Depois de umas atrapalhadas bem divertidas, engraçadas, que me arrancaram boas gargalhadas, livra-se o herói do seu inimigo, que não desejava deixá-lo sair de suas entranhas, e encaminha-se à sua residência. Para adentrar-lhe os domínios de nada adiantaria ele ditar "Abra-te, sésamo!", em alto e bom som, embora estivesse, pra lá de Bagdá, em terras de Ali Babá; precisava de uma chave parar abrir-lhe a porta. Encontrou-a após superar alguns percalços - intransponíveis, dir-se-ia. E dentro da sua casa, passeou de tapetes, que não eram voadores, enfrentou dois felinos ferozes, divertiu-se com uma peralta mesa giratória, exibiu a sua destreza de alpinista, encarou um urso, foi atacado por um relógio, e entrou, finalmente, no quarto, para uma boa noite de sono. Mas a cama não se dispunha a acolhê-lo aos seus braços, tão ébrio ele estava que poderia ser expulso de sua casa e por ela mesma. Enfim, ao fim da sua longa e acidentada jornada, encontrou o herói o repouso tão acalentado.

Nos vinte e poucos minutos deste antigo filme, de mais de um século, assistindo-o, de tanto rir fica-se com dor de barriga e chora-se.


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Wu Kong - Contra a Ira dos Deuses (2017) - direção: Chi-Kin Kwok


Sun Wu Kong (Eddie Peng), o Rei Macaco, confronta os celestiais, que muito tempo antes destruíram o monte Huaguo, seu lar. No reino celestial, conhece os imortais Ah Zi (Ni Ni), linda, meiga e simpática - no início da aventura, estranham-se os dois, mas, obrigados ao convívio comum, eles se apaixonam -, Tian Peng (Hao Ou), habilidoso no uso de armas afiadas, Juan Lian (Qiao Shan), inventor de parafernálias, que nem sempre funcionam a contento, e que durante a batalha com um demônio, revela-se dotado de talento inventivo inigualável, Hua Ji (Yu Feihong), a imortal suprema, e o mestiço Erlang Shen (Shawn Yue), filho de imortal e humano.

Bate-se, no Reino Celestial, Sun Wu Kong com Tian Peng e Erlang Shen. É aprisionado num calabouço. Em segundo embate com os imortais, vem a cair, juntamente com Tian Peng, Erlang Shen, Ah Zi e Juan Lian, na Terra, num vilarejo, onde - agora todos eles sem os poderes de que eram dotados quando habitavam o Reino Celestial - unem-se para salvar os habitantes do vilarejo, atacado por um demônio, e contra este lutam bravamente. E Tian Peng encontra Ah Yue (Zheng Shuang), mulher que ele amava e da qual havia sido afastado muitos anos antes.

É o filme uma aventura chinesa mística, mítica, épica. Tem ótimas cenas de luta, ao estilo chinês, que nos causa certo estranhamento; e humor, em boa dose, simples, inocente - dir-se-ia bobo -, nas cenas que de Juan Lian protagoniza, principalmente. Chamou-me a atenção a beleza das mulheres, o esmero das vestimentas dos protagonistas, e os bem cuidados cenários - o do vilarejo, em especial, simples, de pessoas pobres, não peca pela feiúra, tampouco pela sujeira.

Prendeu-me a atenção a batalha final entre Sun Wu Kong e os imortais.

A aventura do Rei Macaco diverte, anima, entretêm.

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Marx, a luz no fim do túnel.


O Groucho?! O Groucho?! Sim! Sim! O Groucho é a luz no fim do túnel. Divertido! Engraçado! Faz-nos bem. Já o outro Marx, o amigo do Engels...


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Hayek, brilhante.


Brilhante! Linda! Bela! Um colírio! Encantadora! Uma sereia! Uma sílfide! Uma ninfa! Um avião! Que mulher! Não tenho, infelizmente, o dom dos aedos, dos bardos, dos menestréis, para cantar-lhe a beleza. É Salma Hayek um avião!


sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Uma resenha e três contos

 Silêncio, hospital! (County, hospital - 1932) - com O Gordo e o Magro


Neste filme da dupla mais atrapalhada do universo, um hospital é o cenário animado, e divertidamente animado, por Stan Laurel e Oliver Hardy. Stan visita seu amigo Oliver, que está acamado, e tem a perna direita engessada, num quarto, quarto que ele compartilha com outro paciente, um homem histriônico, expansivo, de gargalhada fácil. Ollie não transparece ânimo à chegada do seu amigo de aventuras, que lhe leva de presente ovos cozidos e nozes; transparece contrariedade, já antevendo dores de cabeça. Stan põe-se a degustar os ovos cozidos. E não demora muito tempo, emborca uma jarra, despejando água no leito em que está Ollie deitado. E logo sucedem-se cenas tipicamente burlescas, Stan a socorrer um médico que ele mesmo pusera em apuros e a oferecer ajuda a Ollie. Dividida a sua atenção entre os dois outros personagens, enrosca-se em suas trapalhadas. A cena encerra-se com o desmantelamento da cama em que estava Ollie deitado e a entrada, no quarto, de enfermeiros. E Stan incorre em outras hilárias insanidades, até que, enfim, retiram-se do hospital os dois toleirões, Stan sob efeito de sonífero. E entram em um carro. E põe-se Stan ao volante. Se Stan em seu estado natural de consciência comete os atos mais absurdamente atrapalhados que se possa imaginar, que tolices ele irá cometer, ao volante de um carro, sob efeito de sonífero?


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O Filho que Viaja Demais


De São Paulo, capital, à noite, o filho telefona para seu pai, em Pindamonhangaba:

- Pai, a benção.

- Deus te abençoe.

- Estou em São Paulo. Daqui a pouco, no aeroporto, embarcarei no avião. Irei para o Sul, para perto do Uruguai.

- Embarcar num avião? Não seria num barco?

- Já estou atrasado, pai. Tenho de correr, ou perderei o avião. A benção.

- Deus te abençoe, filho. Chegando lá, no Sul, avise-me. Vá com Deus.

Na manhã seguinte, telefona o filho para seu pai:

- Pai, a benção.

- Deus te abençoe.

- Já cheguei em Pernambuco.

- Quê!? Pernambuco!? Pernambuco!? Filho, Pernambuco fica, no Sul, perto do Uruguai?!

- E eu sei!? Dormi durante a viagem.


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Porcos e porcarias


Renato saiu da sua casa, e rumou, em linha reta, até o açougue, distante uns trezentos metros, e nem bem havia posto um pé dentro do estabelecimento, anunciou-se, em alto brado, chamando para si a atenção de Rafael, o açougueiro:

- Ô, corinthiano, hoje tem você porcaria para me vender?

- Não me falte com o respeito, palmeirense. Aqui não é a casa-da-mãe-joana. Vendemos carne de primeira, suína, de porco engordado com filé mignon e caviar.


*


Bons Amigos


Edson e Renato são dois bons amigos. Jovens, ambos de dezessete anos, são, dizem seus pais, unha e carne. A Dupla, referem-se a eles, assim, familiares, parentes e amigos. Edson, extrovertido, brincalhão, expansivo, de rosto rechonchudo, carrega consigo, desde que veio à luz, nariz empinado de ventas largas, queixo pontudo e sobrancelhas espessas. Não é feio; bonito também não é. É excêntrico. Renato, de um metro e setenta e cinco de altura, atlético, de boa estampa, é dono de olhos azuis que encantam as mulheres. É tímido, introvertido. Ninguém entende como os dois jovens se entendem tão bem. Saídos da escola, à hora do almoço, passaram pela frente de uma lanchonete. Ao ver, à mesa, na calçada, cinco mulheres, todas bonitas, quatro, sentadas, uma, em pé, duas, morenas, duas, loiras, uma, branca de cabelos pretos, Edson perguntou-lhes assim que delas se aproximou:

- Bom dia, princesas - e elas interromperam a conversa, e voltaram-se para ele. - Alguma de vocês deseja se casar com um homem pobre, burro e feio?

- Não - responderam, em uníssono, sérias, as cinco mulheres.

E Edson voltou-se para Renato, e disse-lhe:

- Danou-se, Natão. Você ficará pra titio.

Renato meneou, encabulado, a cabeça, e seguiu caminho. Edson, a gargalhar, ia-lhe logo atrás.

- Natão, você é bobo, mesmo. 'tá vermelho igual pimentão!


quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Um diálogo

 O anti-Bolsonaro, anti-Trump, anti-EUA, pró-Biden.


- O Trump, aquele gringo safado, capitalista, já se foi dos Estados Unidos. Ótimo. Agora, tem o Brasil de se livrar do Bozonazista.

- Você dizia, lembro-me muito bem, desde antes de o Trump ser eleito presidente dos Estados Unidos, que ele, além de provocar a terceira guerra mundial, iria destruir a economia americana. Não me lembro se você dizia que primeiro ele destruiria a economia americana, ou daria o tiro que iria começar a terceira guerra. Não me lembro. Mas, nem uma coisa aconteceu, nem a outra. E a economia dos Estados Unidos, durante o governo dele, estava indo de vento em popa...

- De vento em popa ia a economia do Trump, bozominion?! Você é um negacionista mal informado, que vive de fake news. No ano passado, a economia americana caiu mais de quatro por cento. Informe-se.

- Nos três anos anteriores, o produto interno bruto americano cresceu consideravelmente, e o mercado de trabalho americano atingiu o pleno emprego, ou ficou a ponto de atingi-lo. A economia americana cresceu imensamente nos três primeiros anos do governo Trump. Além disso, os Estados Unidos estavam recuperando, sob a influência positiva das políticas do Trump, a pujança econômica de décadas antes.

- No ano passado, foi um fracasso a economia dos Estados Unidos. O Trump a destruiu.

- No ano passado, o mundo enfrentou uma epidemia. Não vem ao caso se foi a epidemia real, ou fabricada.

- Bozominion, você se diz patriota, mas idoltrada o gringo laranja.

- No ano passado, a economia da Argentina, de Alberto Fernández, e a do Canadá, de Justin Trudeau, e a da Alemanha, da Ângela Merkel, e a da França, de Emmanuel Macron, caíram consideravelmente.

- E o coronavírus, bozominion!? No ano passado, eles tiveram de enfrentar uma epidemia de coronavírus, esqueceu!?

- O Trump também. O coronavírus atingiu todos os países.

- Você é um falso patriota, bozominion. Elogia o Trump. Você quer entregar o Brasil para o Trump. E o seu ídolo, o Mitonazi, o falso messias, aquele nazifascista miliciano genocida da extrema-direita?! O que você tem a dizer dele?! A economia brasileira caiu um tombo de quatro por cento.

- No ano passado, sim; neste ano, não. Recupera-se a economia brasileira. E no ano passado, o Brasil, um dos países localizados no planeta Terra, também se deparou com o coronavírus...

- Não queira defender, bozominion, aquele racista hitlerista supremacista branco disseminador de fake news e discurso de ódio. Ele e o Trump são da mesma laia. Dois fascistas, dois nazistas, dois genocidas. O Trump tinha de sair, e saiu; e o Bozonazi tem de sair, e irá sair.

- Agora os Estados Unidos, sob a direção do Biden, enfrenta problemas imensos: aumento da violência, e é preocupante o aumento dos casos de homicídios; e a imigração desenfreada na fronteira dos Estados Unidos com o México, e deporta milhares de imigrantes ilegais; a crise na economia, que desanda, e os preços de alimentos e combustíveis a subirem, e muito. O Biden está destruindo os Estados Unidos.

- E tem de destruir, mesmo, a terra dos gringos, aqueles capitalistas fascistas!

- Você critica o Trump porque ele estava fazendo os Estados Unidos grande outra vez e elogia o Biden porque ele está destruindo os Estados Unidos. Você não deseja o bem aos americanos, mas mal a eles, a destruição deles.

- É claro, bozominon, é claro. Eles têm de sofrer, mesmo. Que os Estados Unidos se explodam! 

- Mas você criticava o Trump porque, você dizia, ele iria destruir a economia americana. Então, destruir a economia americana, segundo você, era algo ruim; e agora que o Biden está destruindo a economia americana você diz que destruí-la é algo bom.

- Se é ruim para os gringos é bom para o mundo.

- Mas vocé dizia que sob governo do Trump a economia americana iria de mal a pior, então...

- Você e sua lógica fascista, burguesa, de supremacista branco genocida. Você é igual o Bozo, aquele curandeiro, aquele obscurantista. Vocês se merecem. Ele é nazista e fascista.

- Por que ele é nazista?

- Porque ele bebeu leite durante uma "live".

- Beber leite faz dele um nazista?

- Sim. É um ato simbólico! O leite é símbolo da supremacia branca. E ele bebeu leite ao vivo! Provocação! E não queira, bozominion, fingir que não entendeu o significado simbólico do ato dele.

- E o presidente Bolsonaro é fascista? Por que ele é fascista?

- Porque ele passeou de moto e montou à cavalo. Igual o Mussolini, aquele fascista. Estude simbologia política bozominion. Estude!

- Penso que para provar a sua tese, a de que é o presidente Bolsonaro nazista e fascista, você tem de dar a definição de nazismo e de fascismo, indicar os principais representes teóricos destas duas vertentes de pensamento, dar um apanhado geral das idéias deles, falar das políticas de Hitler e das de Mussolini, e elencar as do presidente Bolsonaro, e comparar as dele com as...

- Bozominion, não queira me convencer que é o Bozonazi homem respeitável. Não perca o seu tempo! Nem gente ele é! A sua lógica burguesa fascista é coisa de racistas e genocidas.

- Não entrarei no mérito das questões que você levantou; de tão complexas, elas estão além do meu entendimento. Mas você há de reconhecer que neste ano de 2021, a economia brasileira recupera-se, e no ano que vem...

- Vamos quebrar a economia brasileira, bozominion, para que o Bozofascista genocida não seja reeleito. Vamos impedi-lo de se reeleger, custe o que custar.

- Os índices de homicídios caíram, e...

- Tchau, bozominion, eu não perderei mais nem um segundo do meu tempo com você. Você não sabe argumentar.

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Um

 E para surpresa de ninguém os antibolsonaristas, que até outro dia esgoelavam “Fique em Casa; a economia a gente vê depois.”, agora que o “depois” chegou jogam a batata quente nas mãos do presidente Jair Messias Bolsonaro, e, não se pode deixar de dizer, do ministro Paulo Guedes. Mas foram as medidas do presidente que prejudicaram a economia brasileira? Não. Foram as de governadores e prefeitos, que restringiram atividades comerciais ditas não-essenciais e paralisaram, por meses, a economia de estados e cidades inteiras em nome de uma política sanitária, que se revelou inconsequente – para dizer o mínimo. E tais medidas não tiverem impacto negativo no desempenho da economia nacional? Segundo os inimigos do presidente Bolsonaro, não. E não estou me referindo apenas aos famosos inimigos dele. Para os antibolsonaristas, é o presidente culpado pelo aumento do preço dos combustíveis e dos alimentos – e no mundo inteiro, é óbvio, pois tal fenômeno está a se ver em todos os países. E a China enfrenta uma crise no setor de energia que está a prejudicar imensamente a produção de inúmeros produtos naquele país cuja matriz energética depende imensamente do carvão, que está em estoque mínimo, o que obrigou o governo chinês a paralisar inúmeras fábricas, produzindo, consequentemente, crise de abastecimento de produtos em todo o mundo. E as energias limpas não suprem a demanda; não substituem a “energia suja”. E a Europa está nas mãos de Vladimir Putin, que pode fechar a torneira dos gasodutos se assim o desejar. Brincaram de “Fique em Casa”, uma espécie de esconde-esconde dos adultos; e agora que a brincadeira está para acabar – presume-se – os que se divertiram durante estes quase dois anos não querem saber de assumir suas responsabilidades – é mais fácil apontar o dedo acusador para o presidente Jair Messias Bolsonaro.

Um

 - Na teoria que aprendi, ninguém, e nenhuma idéia, está além da crítica. Tudo pode ser criticado; nada merece elogio, tampouco respeito.

- Tal teoria, penso, que ensina a criticar, e a criticar tudo, é um desserviço à inteligência humana, pois, ninguém sensato ignora, muitas coisas, e coisas de valor, que os humanos criaram merecem elogios, e seus criadores prêmios.

- A crítica à teoria que aprendi, crítica que você apresentou, não merece atenção, é infundada, e favorece a ausência de crítica e a submissão dos humanos a certas pessoas e idéias.

- A crítica que você fez à crítica que eu fiz à teoria que você defende não me parece sensata. A teoria que você defende estimula o que há de pior no ser humano, que, se seguir os ditames dela, teoria que você entende ser o suprassumo da inteligência humana, nada cria, tudo critica, e critica para destruir.

- Você apresentou uma crítica injustificável à teoria que defendo, teoria que defende uma idéia bem simples: tudo pode ser criticado, tudo, absolutamente tudo.

- Tal teoria não produz nada de valor, e tudo corrói, e tudo destrói.

- A teoria se sustenta em seus elementos básicos.

- Ela pode ser criticada da mesma forma que se critica outra teoria qualquer.

- Não, não pode. Se ela é criticada, e tem revelada suas inconsistências, caso as possua, perde o seu valor intrínseco.

- Mas se a ela não se admite critica, então ela não tem valor intrínseco algum, pois se se parte do pressuposto de que tudo o que existe pode ser criticado, então ela, a teoria que você defende, que existe, e porque existe, pode ser criticada. E quem a criou tambêm. E você tambêm pode ser criticado.

- É aí que você se engana, pois quem a pensou é intelectual, e eu tenho preparo intelectual, e você não, afinal, li os livros dele, do intelectual que concebeu a teoria que eu defendo, intelectual que é reconhecido internacionalmente, por inúmeras instituições renomadas, como um dos mais importantes pensadores modernos, e seus livros estão nas bibliotecas das universidades, autênticas guardiãs da inteligência humana.

- As bibliotecas tambêm guardam os livros que tal intelectual critica fazendo uso da teoria que ele inventou, portanto, os livros dele tambêm podem ser criticado, e ele também.

- Não. Não podem.

- É claro que podem. Para que a teoria dele tenha consistência deve-se admitir que ele e a teoria dele sejam passíveis de crítica.

- Mas a teoria dele perde valor se submetida à crítica.

- Por que perde valor? Ela é inconsistente? Tem falhas?

- Não. É perfeita.

- Se é perfeita, que seja criticada; assim, resistindo às críticas, retirando-se ilesa do confronto, prova-se perfeita.

- Não. Nada disso. Que ninguém a critique!

- Você está me saindo àquela gente que diz que tudo é relativo, mas confrontado com uma objeção, que aponta que a idéia que ensina que tudo é relativo, sendo relativa, admite que ela seja absoluta, perde as estribeiras, e descarrega um turbilhão de insultos em cima de quem a questiononou.

- Você tem diploma?! Não tem! Então, cale a boca! Você não tem preparo intelectual. Imbecil! Mostre-me o seu diploma! Mostre-me o seu diploma! Não tem! Não tem!


terça-feira, 26 de outubro de 2021

Um filme

 Monty Python em Busca do Cálice Sagrado (Monty Python and the Holy Grail - 1975) - direção: Terry Gilliam e Terry Jones


A cavalgarem cavalos imaginários, que trotavam ao som de batidas de duas metades de casca de côco, Rei Arthur (Graham Chapman), secundado pelo seu servo Patsy (Terry Gilliam), chega ao castelo cujo dono é sabe-se lá quem. E numa retórica sofística elevada à enésima potência o rei bretão e um guardião do castelo palestram, o guardião no topo do muro, o rei, do lado de fora do castelo, ambos a exibirem oratória de grande fôlego, acerca de cavalos, côcos e andorinhas migratórias. E não demora muito, o rei de Camelot depara-se com camponeses mal-ajambrados, um deles a exercitar seu conhecimento político anacrônico, de luta de classes e sindicalismo e cooperativismo anárquico, ou coisa que o valha, e o faz com tal segurança, que se revela digno ancestral dos revolucionários que puseram a civilização, a partir do século XIX, de pernas para o ar - ele teria registrado seu nome na história das revoluções se algum historiador houvesse se dignado a registrar-lhe os pensamentos e se ele contasse com um razoavelmente bem aquinhoado padrinho que lhe patrocinasse as aventuras intelectuais.

E não muitos passos depois, o rei Arthur testemunha uma sofisticada disputa filosófica envolvendo Sir Bedevere (Terry Jones) e súditos do rei, andrajosos e mal-cheirosos, e cujo tema era o estatuto ontológico de uma bela jovem, que, para os que a acusavam de bruxaria, era uma bruxa, daí desejarem eles queimá-la viva, torrá-la ao fogo de uma fogueira, mas que para Sir Bedevere, dono de inexcedível talento lógico, de embasbacar e queixocair todo bípede implume, usando de filigranas silogísticas tão sutis que escapam ao comum dos homens, talvez não fosse o que diziam os acusadores dela o que eles diziam que ela era, mas era ela um pato de madeira que flutuava à superfície das águas porque tal qual uma bruxa podia queimar se lhe ateassem fogo - se entendi corretamente o raciocínio de Sir Bedevere, que fez o papel de um Sócrates redivivo, a usar com desenvoltura invejável a maiêutica que o ilustre sábio grego criara com a sua oracular ignorância, virtude do mais sábio dos homens, segundo a pitonisa de Delfos - infelizmente, os bretões, no século do Rei Arthur, não contavam com o gênio de Platão para registrar capítulo tão emblemático da história da civilização; felizmente, todavia, contavam com o Monty Python, que, sem se fazer de rogado, se encarregou de registrá-lo, e o fez com a seriedade dos historiadores clássicos. Se não entendi a substância do embate filosófico conduzido com maestria por Sir Bedevere, e é provável que eu não a tenha entendido, Sir Bedevere, no seu confronto dialético, lógico e metafísico e silogístico com os que lhe apresentaram a suposta bruxa, fê-los concluir que ela era bruxa porque, sendo o pato de madeira, suscetível de, exposto ao fogo, queimar, flutuava tal qual as mulheres, ou, então, estou a aventar outra explicação para a cristalina exposição lógica peripatética, socrática e escolástica de Sir Bedevere, são os patos bruxas porque a mulher, de madeira, além de flutuar, queima; ou, então, a mulher, de peso equivalente ao do pato de madeira, flutua, portanto, queima tal qual uma bruxa; ou, então, a madeira, que flutua, e queima, e pode ser usada na construção de pontes, que também podem ser de pedra, tem peso correspondente ao do pato, que, sendo mulher, é uma bruxa.

O leitor, ao ler as palavras do parágrafo anterior, que antece as deste que ora lê, concluiu, eu sei, que me deparei com tão sofisticada e complexa questão filosófica que sou incapaz de reproduzi-la em sua essência.

E depois de o Rei Arthur, e Patsy, seu servo, e Sir Bedevere, e os cavaleiros, que se juntaram à trupe de Camelot não sei quando, Sir Lancelot (John Cleese), Sir Robin (Eric Idle) e Sir Galahad (Michael Palin), enfrentarem, à boca de uma caverna, um coelho demoníaco, e depararem-se com os Cavaleiros que Dizem Ni, e encontrarem o feiticeiro Tim, e construírem um Coelho de Tróia, e chegarem ao castelo Aarrgh, e confrontarem o Cavaleiro de Três Cabeças - não necessariamente nesta ordem -, e superarem outros obstáculos intransponíveis, encerra-se o filme.

"E o Cálice Sagrado?!", pergunta-me o leitor. "O Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda encontraram o cobiçado Cálice Sagrado?" Que fim levou o Cálice Sagrado tão desejado pelo rei bretão e seus fiéis cavaleiros, eu sei; melhor, acredito que sei.

É Monty Python em Busca do Cálice Sagrado iconoclasta, irreverente, disparatado, anárquico. Uma aula de história da Grã-Bretanha da era o Rei Arthur, acredite o leitor.

Ah! Esquecia-me. Se as andorinhas migram, então elas são africanas, e não européias, desde que carreguem côcos.