segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Dois filmes

 O Tigre de Bengala (Der Tiger von Eschnapur - 1959) - de Fritz Lang


Ambientada na Índia, a aventura que Harald Berger (Paul Hubschmid), alemão, engenheiro, protagoniza, é uma trama que, além de envolvê-lo, conta com a participação da mulher pela qual ele se apaixona, a dançarina Seetha (Debra Paget), do marajá de Bengala, Chandra (Walter Reyer), do irmão mais velho deste, Ramigani (René Deltgen), do príncipe Padhu (Jochen Brockmann), e de coadjuvantes, que não estão no núcleo do enredo, mas têm papel importante no desenrolar dos eventos.

Numa certa cidade da Índia, cidade cujo povo é aterrorizado por um tigre que já havia ceifado a vida de alguns de seus habitantes, vivem Harald Berger, Seetha e a serva desta, Baharani (Luciana Paluzzi). Estes três personagens seguem em comitiva para Bengala; ataca-a, no caminho, o tigre tão temido, que vem a ter próximo de suas garras e dentes Seetha; Harald Berger, sem titubear, a manusear uma tocha, de posse de inata valentia, vai em socorro da bela dançarina, e salva-a, ao afugentar o terrível felino. Recompostos do susto, retomam viagem rumo a Bengala.

Acolhida pelo marajá de Bengala, viúvo, que por ela se apaixona ao admirá-la durante evoluções numa dança, Seetha, na companhia de Harald Berger, que foi visitá-la, sentada à margem de uma fonte, evoca uma canção, de cuja letra não se lembrava, e Harald Berger diz ser a canção irlandesa e canta-a, e dela a dançarina recorda-se. Suspeita Harald Berger, então, que é o pai de Seetha irlandês; e o violão, instrumento musical ocidental, que Seetha tem consigo, uma herança deixada pelo pai dela, reforça-lhe as suspeitas. Inspira os sentimentos de Seetha a nostalgia de um tempo, sua infância, do qual ela, além da canção que, agora ela sabe, é de origem irlandesa, nada guarda nos escaninhos de sua memória.

Segue paralela à aventura de amor entre Harald Berger e Seetha e do marajá Chandra pela dançarina, a de Ramigani, que planeja a perdição de seu irmão; almeja Ramigani o trono que ora seu irmão ocupa, mas tem seus planos atrapalhados pelo príncipe Padhu, irmão de Marani, falecida, anterior esposa de Chandra. O príncipe Padhu não tem a pretensão de pôr-se entre Ramigani e seu objetivo, mas incomoda-o, e pode pôr-lhe a perder o que ele ambiciona, ao ir em prejuízo do relacionamento entre Chandra e Seetha, pois não admitia que o marajá substituísse Marani por uma dançarina, enquanto Ramigani queria que se consumasse o casamento entre eles, para poder desmoralizar Chandra e alijá-lo do trono.

São muitos os episódios da aventura em terras indianas: o sequestro de Seetha; a morte de Baharani; a luta entre Harald Berger e um tigre; e outros.

E todos vivem felizes para... Não. Não vivem. Conta O Tigre de Bengala a primeira metade da aventura de Harald Berger e Seetha, e do Tigre de Bengala, Chandra, aventura que se encerra em O Sepulcro Indiano.

Para encerrar esta resenha, duas observações: o estranhamento entre a cultura indiana e a ocidental; e a arquitetura da obra de Harald Berger, apresentada, em maquete, arquitetura moderna, desprovida de beleza, inferior à indiana, exuberante, esplendorosa, magnífica.

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O Sepulcro Indiano (Das Indische Grabmail - 1959) - de Fritz Lang

Nesta segunda e última parte do romance do arquiteto alemão Harald Berger (Paul Hubschmid) com a dançarina Seetha (Debra Paget) há uma sucessão de episódios de estontear, e prender a atenção de, quem acompanha a aventura, que se desenrola em capítulos alternados de dois cenários, que se cruzam: os protagonizados por Harald Berger e Seetha e os que ocorrem no palácio do marajá Chandra (Walter Reyer), capítulos, estes, divididos entre os animados por Chandra e o casal Rhode, Walter (Claus Holm) e Irene (Sabine Bethmann), e os que envolvem Ramigani (René Deltgen) e o príncipe Padhu (Jochen Brockmann).
Chandra, enraivecido, insiste em exigir de Walter Rhode a construção de um sepulcro, que serviria, era seu desejo, de túmulo para Seetha, mas o arquiteto não tinha a intenção de construí-lo, todavia, prisioneiro no palácio do marajá e desejoso de saber o destino de Harald Berger, seu cunhado, resigna-se, não a cumprir a ordem de Chandra, mas a conservar-se em Bengala para descobrir que fim levara o irmão de sua esposa. Enquanto os Rhodes, com o talento que fez a fama de Sherlock Holmes, investigam o caso que muito os intriga, e colhem informações que os deixam apreensivos, e tiram de um esquivo e amedrontado Asagara (Jochen Blume), que se via num dilema enervante - ou dedicava lealdade ao marajá, seu senhor, ou a Harald Berger, seu amigo - alguns dados que lhe aumentam as suspeitas acerca das intenções de Chandra, Ramigani, o irmão mais velho do marajá, trama a remoção de seu irmão do trono de Bengala, com a ajuda, indispensável, do príncipe Padhu, que, orgulhoso, não queria ver uma dançarina ocupando uma posição, a de esposa de Chandra, que outrora pertencia à sua falecida irmã, Marani. Harald Berger e Seetha viviam numa vila, em fuga, caçando-os Ramigani, e vem a serem por ele capturados. Seetha é levada ao Palácio de Chandra; e Harald Berger ao calabouço. Sucedem-se os episódios; desenrola-se a trama. A apreensão de Ramigani é visível; e ele se ocupa de criar o ambiente apropriado ao casamento de Chandra e Seetha, e para executar o seu plano precisaria do apoio do príncipe Padhu, o que ele teria se persuadisse Chandra a desposar Seetha, mas Chandra não pretendia casar-se com ela, pois sabia que ela, ao contrário do que ouvia de Ramigani, fugira com Harald Berger sem que este a coagisse à fuga. É interessante o cinismo de Ramigani, que, ao mesmo tempo que planeja a perdição de seu irmão, fá-lo acreditar que ele, Ramigani, o ama e quer-lhe a felicidade ao lado de Seetha. E Harald Berger, acorrentado, no calabouço, só, luta pela sobrevivência, e é bem-sucedido em seu ingente esforço, em nenhum momento, embora adversa a sua situação, seu ânimo vindo a esmorecer. E a história, enfim, chega ao episódio derradeiro, o do ritual de casamento de Chandra e Seetha, quando se dá a intervenção do sacerdote Yama (Valéry Inkijinoff), que se opunha ao enlace matrimonial entre o marajá e a dançarina e não apoiava a ação traiçoeira de Ramigani e Padhu, mas que, ao opor-se a Chandra, foi de auxílio imenso aos dois ladinos inimigos dele. E entra em cena o general Dagh (Guido Celano). E todos vivem felizes para sempre. Todos, não; o arquiteto alemão e a dançarina, sim - o que não surpreende ninguém; e não estou, aqui, a revelar nenhum segredo escondido a sete chaves, afinal, os heróis, em romance de tal gênero, o destino sempre os presenteia com a felicidade.
E adiciono dois pontos, que me chamaram a atenção: o destino de Chandra, para mim inusitado, que muito me surpreendeu; e a ausência de uma explicação para a origem de Seetha, se era ela de pai irlandês - tal suspeita em suspenso em O Tigre de Bengala.
É O Sepulcro Indiano uma aventura com reviravoltas verossímeis, todas a formar uma arquitetura dramática muito bem elaborada.

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