terça-feira, 20 de março de 2018

Semântica

Uma palavra tem inúmeros signifcados, e, dependendo do contexto, pode assumir um significado oposto ao que está dicionarizado. Quando se usa da ironia, por exemplo, "lindo" pode signifcar feio, e "inteligente", burro. Exemplo: Duas moças vêem um homem feio, e uma delas, sorrindo, exclama: "Lindo!"; e um homem, ao tomar conhecimento de um ato alheio de inegável burrice, diz: "Inteligente". Tais interjeições irônicas são muito comuns, e todos os que as ouvem as entendem. Do mesmo modo, um palavrão, dependendo do contexto, pode não ser uma ofensa, mas um elogio; e uma expressão grosseira, uma crítica, ou um elogio. Exemplos: num grupo de jovens ocupados em resolver um problema complexo um deles, surpreendo os outros, o resolve, e, solicitado a explicá-lo, o faz, e os outros jovens, impressionados, exclamam: "Cara, você é filho-da-puta!"; um homem assiste a um jogo de futebol, e num certo momento um jogador pisa na bola, literalmente, e cai, e o homem grita: "Cagada!", e em outro momento do jogo, outro jogador, numa cobrança de falta, faz um gol de placa, e o homem exclama: "Cagada!".
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Dá-se às palavras uso criminoso os políticos e intelectuais, deturpando-lhes, conscientes de o fazerem, o significado. Muitos, ao expressarem amor pela liberdade do povo, têm o propósito de oprimi-los; muitos, ao tecerem loas à liberdade de expressão, criam um ambiente favorável à supressão da liberdade. Usam da palavra "liberdade" num contexto que, se bem entendido, quer dizer opressão. Não é raro, também, ouvir profissionais da imprensa, em peroracões favoráveis à liberdade de imprensa, justificar a supressão da liberdade daqueles profissionais da imprensa que pensam diferente, e o fazem dando-se como legítimos paladinos da liberdade, e justificando a supressão da liberdade alheia com discursos de justiça, horror ao "discurso de ódio" daqueles que deles divergem. E o que é o tão reprovado "discurso de ódio"? Em muitos casos, verdades inconvenientes, as quais representam consideráveis ameaças aos donos de poder.
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 E quando se usa da palavra "crítica", ou de "senso crítico", ou "pensamento crítico", então, nem se fala. Por exemplo: Para os socialistas têm pensamento crítico, senso crítico, quem critica idéias que se opõem ao socialismo, mas não têm, nem senso crítico, nem pensamento crítico, quem crítica o socialismo - neste caso, a crítica feita é dada como ausência de pensamento crítico, é atitude acrítica, dizem os socialistas, de gente que já sofreu lavagem cerebral capitalista. Crítica, aqui, não é crítica: é submissão à ideologia socialista.
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Muitos intelectuais, discorrendo acerca da liberdade, têm em mente realizar o seu propósito inconfessado: a opressão. Li, recentemente, de Herbert Marcuse, o livro Eros e Civilização. Em tal livro o autor, evocando Freud, Nietzsche, Hegel, e até Platão, exibe-se como um profundo amante da liberdade, uma liberdade sem freios. Ora, ao defender a liberdade como o fez, com certo requinte vernacular e uso do jargão da psiquiatria, Marcuse aponta a civilização (patriarcal), a religião e a razão como as fontes de repressão dos instintos naturais. Não é difícil identificar, nesta tese, a aversão de Marcuse à religião cristã e à civilização ocidental. E com a liberdade sem freios não se obtém a liberdade, e, consequentemente, a felicidade, supostamente desejada, e sim a necesssidade de se instalar um governo totalitário para conter as pessoas, que, sem freios, não têm limites em suas ações. Em nome da liberdade, então, está a se defender a opressão.
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E nestes dias viu-se, após o assassinato de Marielle Franco, do PSOL, o mal uso da palavra "investigação".
Os militantes psolistas exigem, da Polícia, investigação rigorosa do crime. Na verdade, eles não querem uma investigação, tampouco uma que seja rigorosa; eles querem que a Polícia seja acusada pelo crime, eles querem impedir uma investigação, pois já indicaram um culpado: a Polícia. "Investigação", aqui, quer dizer, "a polícia é culpada". Eles estão fazendo uso político da tragédia antes mesmo de o cadáver esfriar; e antes de qualquer investigação, já apontaram o culpado, a polícia, e discorreram em favor da extinção da polícia militar e do encerramento da intervenção militar no Rio de Janeiro.

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